2 de jun. de 2017

Novo ensino médio: o que a propaganda não diz

"Novo Ensino Médio, quem conhece confia", diz a propaganda do governo federal, veiculada diariamente nas redes nacionais de televisão ao longo de meses, mesmo depois que a Lei que instituiu a reforma ter sido sancionada pelo Presidente Michel Temer, em 16 de fevereiro deste ano.

Mas não foi bem esse clima de confiança que a equipe do Contexto Repórter encontrou quando saiu a campo para verificar como a proposta de mudança estava sendo recebida em Sergipe pelos jovens estudantes, seus professores e gestores de escolas públicas e privadas de Ensino Médio.

Aliás, consulta pública realizada pelo portal do Senado sobre a medida provisória que instituiu a mudança recebeu 73.565 votos contra e 4.551 a favor. Ainda assim, a proposta teve 43 votos favoráveis de senadores e 13 contra. Isso depois de ter passado pela Câmara Federal, onde 263 deputados votaram a favor da reforma, 106 contra e 3 se abstiveram.

Nossos repórteres percorreram escolas e colégios de diferentes bairros da região metropolitana de Aracaju e de algumas cidades do interior - do Agreste ao Sertão. E o que mais surpreendeu nesta empreitada foi o desconhecimento de boa parte dos gestores contatados sobre os conteúdos da proposta que, na época, estava sendo votada no Senado Federal.

O que esta reportagem especial também revela é que a reforma está longe de ser unanimidade. Mesmo as pessoas que se mostram otimistas com as mudanças nesse nível de ensino apontam aspectos problemáticos, sobretudo quanto à escolha de disciplinas optativas pelos jovens, a adoção do horário integral em colégios públicos e a permissão para contratação de professores com "notório saber". A lei também altera a carga horária, flexibilizando a grade curricular, com disciplinas obrigatórias e optativas, e introduzindo formação profissionalizante junto com o ensino regular.

Siga o roteiro abaixo e veja o que se espera do Novo Ensino Médio em Sergipe.

Novo ensino médio: o caminho polêmico (Pedro Netto)

Modelos estrangeiros inspiraram reforma (Emerson Esteves)

Governo diz que teve "100% de aprovação" (Malu Araújo)

Maioria foi contra, mostra consulta pública no Portal do Senado (Samuel dos Santos)

Promessa de investimentos x redução dos gastos públicos (Fernanda Santos)

O ensino integral no centro da polêmica (Letícia Sandes)

Mais carga horária com menos disciplinas (Cláudia Silva Carvalho)

Liberdade de escolha até que ponto? (Thalia Freitas)

A solução que traz novos problemas (Victoria Costa)

Alunos reclamam da falta de informação (Joyce Oliveira)

Quem ganha, quem perde com as mudanças (Larissa Valença)

Dois modelos em confronto (Letícia Nery)

Uma reforma e dois mundos (Vinícius Oliveira Rocha)

Entre o ensino público e o particular (Eduardo Costa)

Professores e gestores escolares demonstram incertezas (Haline Farias)

Alunos e professores de São Cristóvão debatem reforma (Fernanda Roza)

Formação técnica e profissionalizante em questão

Brasil já oferece ensino técnico de excelência (Ana Luísa Andrade)

Novo Ensino Médio, à espera de 2019 (Katiane Peixoto)


1 de jun. de 2017

Novo ensino médio: o caminho polêmico

Por Netto Ribeiro

No dia 16 de fevereiro deste ano, o presidente Michel, sancionou a lei que cria o novo ensino médio no Brasil. Acompanhe sua trajetória:

Os primeiros passos: A MP

O presidente Michel Temer lançou, no dia 22 de setembro do ano passado, a Medida Provisória n° 746 que estipula mudanças no ensino médio brasileiro. Segundo o Ministério da Educação, a proposta é uma resposta do governo federal aos baixos índices de qualidade apontados pela pesquisa recente do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), que indicou uma estagnação dessa fase de ensino no país.

Dentre os principais pontos do texto inicial, está o prolongamento gradativo da carga horária básica anual, que deve passar das atuais 800 horas às 1.400 horas/ano, atingindo o período integral. A flexibilização do currículo - que será dividido em duas partes, uma com matérias obrigatórias, uma com optativas -, assim como a retirada de disciplinas do componente curricular obrigatório e a permissão para contratação de profissionais de notório saber, também são itens em destaque que geraram controvérsias. O texto ainda traz o ensino profissionalizante com aulas práticas e teóricas como opção.

O governo investirá 1,5 bilhão para implantar o tempo integral nas escolas, em parceria com as secretarias de estado. A perspectiva é ter, pelo menos, 500 mil alunos matriculados em escolas com ensino integral até o final de 2018. Como a MP, durante a sua vigência de 120 dias, tem força de lei, a ideia era começar de imediato os preparativos para a implantação do projeto, porém, seria necessário aguardar a publicação da Base Nacional Comum Curricular(BNCC), documento que determina os conhecimentos que devem ser trabalhados nas escolas durante a vida escolar em todo país, prevista para o primeiro semestre deste ano.

IFS Campus Lagarto ocupado
 (Foto extraída do portal Lagarto Notícias) 
Apesar dos argumentos utilizados para justificar a urgência da Medida Provisória, vários segmentos sociais não deixaram de se manifestar contra a decisão do governo Temer. Estudantes desfavoráveis ao projeto ocuparam escolas de todo o país promovendo debates e opinando sobre a proposta. No interior do estado, o colégio Dr. Milton Dortas na cidade de Simão Dias (avaliado entre os dez melhores no Enem 2014), e o IFS Campus Lagarto ainda foram ocupados por estudantes no início deste ano.

A nova estrutura

Mais tempo na escola

A carga horária básica atual de 800 horas, progressivamente vai sendo ampliada, para chegar às 1400 horas/ano. O Plano Nacional de Educação(PNE) espera que 50% das escolas sejam contempladas pelo ensino integral e 25% das matrículas do ensino fundamental também sejam atendidas até 2024.

O currículo flexível

O novo currículo será dividido em duas partes: uma convencionada por uma base comum, obrigatória em todas as escolas, que não poderá ultrapassar 1.800 horas da carga horária total; Outra, composta por itinerários formativos nas diversas áreas do saber ou ensino profissionalizante.

Os estados terão autonomia

O componente curricular obrigatório não poderá exceder 1.200 horas da carga horária, podendo cada estado, organizar o currículo optativo de acordo com a sua realidade regional, cultural, econômica, social e ambiental.

Formação técnica

Será ofertada qualificação técnica profissional, com aulas práticas e teóricas, sem que seja necessário que o aluno esteja no ensino integral.

Aproveitamento de disciplinas

Concluindo uma disciplina, o aluno vai adquirir créditos que poderão ser utilizados no ensino superior ou técnico, não cursando uma disciplina já concluída.

O texto original apresentou lacunas em vários pontos, como por exemplo, no que diz respeito ao ensino de Educação Física e Artes. Disciplinas como Filosofia e Sociologia foram retiradas do componente curricular obrigatório e apenas suas práticas e ensinos foram garantidos no texto final. História e Geografia não são mencionadas. Várias entidades que representam diferentes áreas do conhecimento apontaram a medida do governo autoritária, a Sociedade Brasileira de Sociologia(SBS) diz que a MP “fere a Lei de Diretrizes e Bases da Educação prevista na constituição.” A Associação Nacional de História repudiou a decisão:

“A forma escolhida pelos atuais mandatários de apresentar uma proposta dessa envergadura que impacta diretamente todo o Ensino Médio e afeta a formação de professores por meio de medida provisória, escancara o caráter autocrático do governo na medida em que contraria as atuais Diretrizes Curriculares Nacionais, atropela processos de debate em curso no país, inclusive no Congresso Nacional, e exclui segmentos diretamente envolvidos nas discussões como docentes, alunos e associações.”

A Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação(Anped) se manifestou e disse que a decisão é “autoritária e equivocada em conteúdo”. Instituições estudantis como a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas(UBES), também se posicionaram negativamente, criticou a flexibilidade do currículo, a carga horária e a falta de diálogo. Além disso, a instituição se preocupa com a efetividade do PNE(Plano Nacional da Educação) com a reforma.

A lei e suas controvérsias

Depois dos 120 dias do prazo de validade da MP, o Senado aprovou, no dia 8 de fevereiro deste ano, o texto original da medida e manteve todos os seus eixos, inclusive, as nebulosidades. A partir disso, o presidente Michel sancionou, no dia 16 do mesmo mês, a reforma do ensino médio.

No tradicional Colégio Estadual Prof. Abelardo
Romero Dantas a lei divide opiniões.
(Fotodo portal Lagarto Notícias)
Muitos pontos ainda são pouco esclarecidos, como por exemplo, qual será o critério para a admissão de profissionais de notório saber e no que isso implica para o aluno e para o magistério. Gisélia Duarte de Souza Muniz, secretária e membro da diretoria do Colégio Estadual Professor Abelardo Romero Dantas, na cidade de Lagarto, falou sobre a questão:

“Quando eu estudei ensino médio tive professores advogados, médicos. Isso não tirou o valor que eles tinham a me ensinar. Eu vejo uma desvalorização do professor, mas vejo que o notório saber é positivo para o aluno. Vejo uma perda para o professor. Passa, de repente, anos na universidade e de repente vê alguém tomando a sua posição.”

Com a nova lei em vigor, a comunidade escolar se preocupa com o futuro da escola no país. Pais, alunos, coordenadores, discutem mais do que nunca o assunto que tem gerado reações diversas. Ainda existem muitas dúvidas de como será a adequação à reforma. Sobre a implementação do ensino integral, Gisélia diz:

“Discutimos em parte, ouve uma rejeição por parte dos professores. Não tivemos esse tempo para discutir. [...] a teoria é uma coisa, a prática é diferente.”

A Medida Provisória foi votada com celeridade no Congresso Nacional, e a justificativa da sua urgência fez com que os alunos não fossem ouvidos satisfatoriamente, o que se pode deduzir pelas constantes críticas da classe à falta de diálogo. Matheus dos Reis de Oliveira, 17, recém-saído do ensino médio, problematiza:

“Ambíguo (o texto). Tem que ouvir os pais, que são experientes. Quem decide é o povo e não uma única pessoa por duzentos e poucos milhões. A maioria do que você apreende está no ensino médio, e se deixar vago a pessoa não vai se formar direito.” Ele fala sobre a retirada de algumas disciplinas do currículo.

Sobre a mesma questão da flexibilização, Débora Santana Ribeiro, 16, que acabou de ingressar no curso de Direito, nos diz:

“Creio que não seja um avanço, é claro que há seus pontos positivos, principalmente na questão profissional e técnica, mas, particularmente, eu não quero ver pessoas formadas apenas para exercer suas futuras profissões, eu enxergo o mesmo erro do modelo atual, alunos sendo preparados apenas para o vestibular e mercado de trabalho, cogito que o social, a cidadania, esteja ficando de lado.”

Quando compara o ensino médio que teve com o novo, Débora é pessimista:

“Pensando enquanto disciplina de Artes, poderia ser passada pra gente de uma melhor forma, completamente deixada de lado, o foco sempre foi Enem, e o incentivo ao lado artístico dos alunos não existiu, simplesmente não havia práticas. Então, eu vejo o quanto o Ensino médio que tive foi deficiente, mas fico ainda mais entristecida ao ver que a reforma traz os mesmos problemas, ou problemas ainda piores.”

Apesar da aprovação da nova medida transformada em lei, as discussões parecem longe de estancarem. O novo ensino médio surge como uma nebulosa surpresa no cenário complexo da educação no Brasil.

Promessa de investimentos x redução dos gastos públicos

Por Fernanda dos Santos 

      Uma das primeiras contradições da lei do "Novo Ensino Médio" é com a redução de gastos na área da educação imposta pela PEC 241, embora, o governo diga que investirá cerca de 1,5 bilhões com essa reformulação, em dois anos, com a expectativa de que 500 milhões de jovens estejam em escolas de tempo integral até 2019.

      Especializado em gestão de organização escolar, Yure Norberto faz uma análise da situação e explica que, superficialmente, soa como contraditório, mas o real debate que deve se fazer é sobra a forma como o Ministério da Educação trabalha. É importante observar o que está por trás da aprovação de uma a PEC 241 que limita gastos para a educação e também a MP que mobiliza o aumento destes.

       O especialista explica que “o dinheiro  especificamente para uma política pública é limitado, por isso, precisa-se discutir quais medidas merecem prioridade e um investimento maior”. Segundo ele, “quando se fala de educação, quanto mais recursos, melhores serão os resultados. Mas o plano é finito, pois o estado não tem condições de financiar vários processos por inteiro, o tempo todo, é necessário fazer escolhas. Por causa de toda essa contradição teremos que abrir mão de algumas coisas para poder investir em outras.” O gestor indaga: “Quantas bolsas de FIES conseguem ser financiadas como este valor? E quantas escolas em tempo integral podem ser construídas? Então se o dinheiro está curto, qual a prioridade?”.

O poder da escolha

Colégio Estadual Dom Luciano José Cabral Duarte

“Os jovens poderão escolher o currículo mais adaptado às suas vocações”, prega o MEC, alegando que a reforma vai permitir que estudantes e escolas do ensino médio possam aprofundar seus conhecimentos adaptando o currículo às habilidades do aluno. Mas para o professor Fabiano Oliveira, essa proposta não é real, embora fosse ideal. Ele leciona Língua Portuguesa na escola estadual Dom Luciano, em Aracaju, e avalia que, culturalmente, não estamos preparados para isso.

“O formato é legal, entretanto, não é um hábito nosso é mais americano do que brasileiro. Além disso, nossa educação está no século XX e tem modelos jesuíticos (uma cadeira após a outra), sendo que estamos no século XXI. Por mais modernos que estejamos, ainda estamos presos às tradições. Assim, antes de ver se isso é bom ou ruim temos que observar a situação presente, que não está boa. Temos duas opções, continuar ou tentar mudar algo” – propõe Oliveira.


Centro de Excelência Atheneu Sergipense  

Wilemberguer Rodrigues, licenciado em História e professor do Centro de Excelência Atheneu Sergipense, em Aracaju, concorda que essa é mais uma das diversas controvérsias sobre a reforma. Ele não acredita nessa ideia de que aluno tenha capacidade de escolha. “Ainda estamos engatinhando e não temos continuidade de projetos espelhados em países desenvolvidos que certamente souberam esperar as propostas terem resultados.”



Escola Novos Rumos, em Nossa Srª do Socorro 
"Todo conhecimento que é dado hoje é utilizado na vida do aluno e o Enem prova isso", afirma Michel Souza, coordenador pedagógico do ensino médio da escola privada Novos Rumos, na cidade de Nossa Senhora do Socorro.

      De acordo com a medida provisória a ampliação do ensino médio para quatro anos foi pensada com intuito de beneficiar o jovem brasileiro, que termina muito cedo os estudos. De acordo com a MP, o estudante pode escolher mudar de diretriz e estender mais um ano.

      Caio Gabriel Alexandre Evangelista,18 anos, aluno do 3º ano do ensino médio na escola estadual Dom Luciano, acredita que a possibilidade de escolha é um ponto positivo da reforma. Isso porque, para ele, muita das vezes o aluno acredita ser desnecessário estudar matérias pelas quais não tem relevância no futuro profissional.

Propaganda enganosa?

     “Esse discurso positivo só pode ser feito por quem está no poder, nós que estamos abaixo recebemos a propaganda. Agora cabe a sociedade a reflexão. Caso o aluno tenha a capacidade de criticar o projeto e formar sua opinião, não tem propaganda que mude. Antes de falar que é bom ou ruim, devemos observar os pontos positivos e negativos e compará-los com a situação presente da educação brasileira, aconselha Oliveira.

      Para o professor Willembuguer Rodrigues, “aquilo que é bom não precisa de propaganda, mas aquilo que é duvidoso imperativo, autoritário, impositivo como a medida provisória é preciso legitimar por meio dela. Como dizia Joseph Goebbels, chefe da assessoria nazista, ‘uma mentira dita mil vezes se tornaria uma verdade’”.

     Yuri Norberto Pereira, questiona qual é o custo que estamos pagando para publicitar o novo ensino médio. O interessante é dialogar com as escolas e a sociedade. Além do mais, a Secretaria da Educação tem uma rede capaz de chegar as escolas de forma eficiente temos os conselhos de classe, estadual e instituições comunitárias.

Mais tempo na escola

      A nova lei do ensino médio prevê a ampliação da carga horária de 800 para 1.400 horas anuais, de forma gradativa. Todavia, ainda há questionamentos em relação ao horário do aluno no colégio. Wilemberguer Rodrigues, professor de História, conta que costuma dizer que “a escola é tudo hoje, menos escola, é creche”. Para ele, a saída não é aumentar a quantidade de dias letivos e carga horária pensando que a sala de aula é que vai transformar esse aluno: “pelo contrário, pode ser um tiro no pé”, alerta.

      Ex-estudante do ensino médio integral do Atheneu Sergipense, Natalia Souza, hoje discente de Economia na UFS, fala que de início não gostava muito da ideia de passar o dia todo no colégio. “Achei que iria tomar o meu tempo mas, pelo contrário, os instantes que eu passei no centro integral serviram como incentivo para eu estudar. O aluno tem que se transformar cada vez mais em estudante e não ser mais um matriculado no colégio. Afinal, é a educação que leva a gente para qualquer lugar”, afirma ela.

    José Sebastião dos Santos Filho, integrante da diretoria da Federação Nacional de Estabelecimentos Particulares de Ensino (Confenem), aponta uma contradição importante entre o parecer do Senador Pedro Chaves, Relator Mista que a medida provisória 746/ 2016, que deu origem à reforma, e o projeto de lei que a consolidou. O Senador diz à página 13 do seu relatório que:

"(...) 60% da carga horária do ensino médio deverão ser destinados à BNCC [Base Nacional Curricular Comum], a fim de garantir a unidade e a sincronia entre as escolas brasileiras. Optamos pelo percentual porque acreditamos que expressa um equilíbrio desejável que superará o valor de 1.200 horas previsto originalmente, que é insuficiente para propiciar que todos os estudantes acessem conteúdos relevantes para essa etapa da educação básica”.

Já a pagina 6, do 5º do art. 35-A do PLV 34/2016 afirma que: “ A carga horária destinada ao cumprimento da Base Nacional Comum Curricular não poderá ser superior a mil e oitocentas horas, do total da carga horária do ensino médio, de acordo com a definição do sistema de ensino”. Ou seja, enquanto o senador Pedro Chaves indicou que a BNCC deveria corresponder ao mínimo de 60% da carga horaria do ensino básico e fundamental, o texto da lei usou esse percentual como máximo.

Inviabilidade do curso noturno

Colégio Pio Décimo 
      Assessor da direção do colégio Pio X, em Aracaju, Sebastião Santos Filho acredita que de fato o aumento da carga, somente por horas, não leva a lugar nenhum. Ele afirma que o maior ponto negativo da ampliação é inviabilidade do ensino noturno. Por exemplo: “ se o jovem tiver que trabalhar para seu próprio sustento /ou para auxiliar em casa, ele provavelmente primeiro terá que completar 18 anos para ter acesso ao ensino de EJA (Educação de Jovens e Adultos), porque com a implantação o governo não esclarece como vamos dar aula em sete horas no período da noite”, cita Sebastião.

É importante observar que o aumento de carga horária da escola particular representa aumento de custos, que é repassado para a mensalidade escolar. “Esse é um dos maiores pontos discutidos pela Confenem, porque de certa forma esse novo ensino médio vai privilegiar poucos alunos da iniciativa privada, somente os que tem a possibilidade de pagar as mensalidades mais altas”, diz Sebastião.

      A estudante Gracekelly de Jesus, 16, do 2º ano do colégio particular Novos Rumos, demostra a dificuldade que irá passar com ampliação horária. “ Para mim não seria favorável, pois sou jovem aprendiz no turno da manhã”, afirma.
   
Ensino integral em Sergipe

      O governo de Sergipe vem ampliando o ensino médio em tempo integral nas escolas públicas desde 2009. Ao cumprir as legislações federais (PNE) e estadual (PEE) o objetivo é ampliar a oferta de vagas e atingir a meta de 50% até o ano de 2024. De acordo com a Secretaria da Educação de Sergipe, as escolas vão implementar o novo modelo de forma gradativa, referenciando-se a demanda da comunidade escolar e respeitando o estudo de impacto realizado com os alunos e professores. Os repasses de recursos do governo federal serão feitos ao longo de 10 anos e serão aplicadas na melhoria da estrutura e na modernização de laboratórios.

“ O ensino integral é interessante porque a gente tira os jovens das ruas”, opina a universitária Natalia Souza. “Mais a questão toda é como será essa forma de ensino, pensando como os educadores a gente acredita que os alunos se tornarão mais alienados do que hoje ”.

O especialista em gestão e organização escolar Yure Norberto Pereira avalia que o novo e o integral dialogam, mas que nem todas as escolas conseguirão atingir a meta de implantar o integral até 2024 e alcançar os 50% das matrículas previstos pela lei.

Flexibilização curricular
   
 Yure Pereira esclarece o funcionamento da flexibilização do currículo estudantil. “Durante um ano em meio o aluno vai ter como eixo as disciplinas estabelecidas pela Base Nacional Curricular, que deve se concretizar até a metade deste ano, ou seja, todas as matérias. Na metade do segundo ano e no terceiro entrará a figura da optativa. Isso pode assustar um pouco no início, mas é um debate que os próprios professores já fazem há algum tempo. E as optativas vão depender da área que o aluno deseja seguir.”  Por exemplo: “caso o estudante escolha a área de ciências biológicas irá pegar as matérias da área e as obrigatórias português, matemática, inglês; o resto ficará como optativa. Me parece interessante, mas, temos que ver isto na prática”, pondera.

A estudante de Economia da Universidade Federal de Sergipe (UFS) Natália Souza acredita que não haveria necessidade de tirar as disciplinas. “Nós temos experiências com centros de excelências públicos onde os alunos estudam em período integral, a grade curricular é normal à tarde farão aulas diferenciadas relacionadas ao esporte, arte, saúde e entre outras. ”

      “Conhecimento é base para ter êxito na vida” acredita Wilemberguer Rodrigues Oliveira. Mas para ele, o objetivo desse governo “é preparar os alunos para serem mão de obra a nível médio para o mercado, sem dar o direito a esses alunos de seguirem para o nível superior”. Com isso, a tendência é que haja uma diminuição de vagas nas universidades, acredita o professor de História.

A polêmica do "notório saber"
   
      “A MP [que virou lei] faz um ataque frontal à carreira docente, na medida em que admite que indivíduos ‘com notório saber’ possam dar aula, fica claro que não haverá investimento na formação de professores. Faltarão docentes e muitos deixarão de ser professores. ”afirma a presidente do Sindicato de Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo, Maria Isabel Noronha.

      Fabiano Oliveira compreende que a líder do sindicato tenta discutir sobre a falta valorização do professor, “é uma medida governamental e não estatal.  A questão de nós professores não ter sido chamados ou informados, à verdade é que não temos informações claras o gerou tal repercussão. Bom sabe-se tal fator na área técnica é permitido, com a seleção e graduados adequados a lei. ”

       Além disso, Yure Noberto diz “ fizeram muita zoada por pouca coisa”, porque já era possível fazer isso, nos termos da LDB. “O objetivo que propõe o notório saber é preencher essas brechas especificas. Isso não chegará nas escolas, nem de nível regular e na instituição técnica só chegará na medida excepcional. Mas concorda que faltou um pouco de comunicação.”

      José Sebastião Filho, assessor da Colégio Pio X fala, que é um ponto polêmico pois, ao entra na questão sindical “que obviamente quando se trata do sindicato ele somente aceita medidas que beneficiem a classe. ” Fato é que neste sentido o notório saber dever ser discutido em alguns pontos. Exemplo, a lei obriga que a partir do 6º ano do ensino fundamental somente os professores licenciados naquelas disciplinas possam leciona.

      “No ensino básico e regular talvez não tenha tanto problema pois você tem hoje cursos de licenciatura nas várias áreas. Apesar de que também existe um déficit de professores principalmente nas áreas de exatas.        Quando ela colocar que vai desvalorizar a carreira. No meu ponto de vista, o que “falta é uma política pública de incentivo a carreira do professor. ”

       “Se você fizer uma pesquisa no ensino médio, principalmente no terceiro ano do ensino médio e perguntar quantos deles querem ser professores, pouquíssimos vão responder que sim, isso parte de um governo que tem uma ação ausente na criação de políticas públicas que valorizem a carreira docente. O professor é base de todas as formações”.

CEED coloca os pingos nos is

      Em entrevista ao Contexto Repórter,  e a presidenta do Conselho Estadual de Educação de Sergipe, Luana Silva Boamorte de Matos, também integrante da Diretoria Regional de Educação do Alto Sertão (DRE), esclareceu as principais dúvidas com relação à implantação do novo ensino médio.
Conselho Estadual de Educação de Sergipe 

      “O novo ensino médio parte do pressuposto de ampliação de carga horária de 800 horas para 1.400 horas anuais. Então todas as escolas do sistema estadual que incorpora as escolas de rede privada e públicas farão parte do ensino médio. O novo ensino médio é para todo mundo e o integral é uma proposta que está previsto nos planos nacional e estadual de educação. Na meta 6 fala que 50% da oferta na escola pública tenha que ser em tempo integral e 25 % das matriculas sejam nessa modalidade. Diante disso, há fôlego maior para esta implantação do tempo integral” – completa Silva de Matos.

      Um ponto positivo a diretoria do CEES reconhece no novo ensino médio é fortalecimento do pacto federativo “porque as organizações curriculares e as organizações do novo ensino médio vão se processar nos conselhos estaduais”.
“Estamos aguardando a demanda. A gente vai esperar as escolas se organiza os prazos vão ser estabelecidas, então, as escolas se organizam por áreas e quais disciplinas vão ser ofertadas. Há uma parte diversificada que ficará a escolha da escola. E temos que esperar as organizações BNCC quanto a grade curricular.”

     Cada escola terá que enviar ao Conselho o currículo, como vai ficar organizado durante os três anos, para ser analisado e aprovado. Mas, de antemão, o ensino de matemática e português, inglês acontecerá durante os três anos, concentrando os componentes da BNCC. Esta é a questão que está mais forte no campo. “Em uma outra parte da carga horária entrarão os chamados itinerários informativos que seria linguagens códigos, ciências humanas e biológicas e uma quinta que vai ser um ensino profissionalizante, então a ideia dentro da secretaria de educação é que cada escola oferte dois itinerários informativos no mínimo. Enfim, ela tira a feição de disciplina, a base, e incluirá estudos e práticas.

A presidenta Luana Boamorte afirma a gente já trabalha com notório saber! “O objetivo não é tira o profissional docente da sala de aula para colocar qualquer pessoa que goste do tema para ministra aula não, os licenciados foi avanço de acordo com LDB; agora essa mudança permite que indivíduos com notório saber trabalhe no campo profissionalizante”, esclarece.

      É importante ter o básico uma parte vai ser destinado para isso e o outro quantitativo é de destaque para formação de professores. Inclusive, eles vão organizar de 29 a 31 uma formação de abordagem administrativa pedagógica. É uma nova escola que tentam implementar (a escola integral). Já o debate de avaliação é de cunho pedagógico é complicado porque vem de instituição de prova de não reconhecer o processo de aprendizagem do aluno em que ele precisa ser avaliado.

      Sobre o modo de discurso utilizado pelo governo, a presidenta da CEED diz que é uma ação de governo, está à frente acredita que é necessário. É utilizar o dinheiro para destinar a este fim para publizaisar a matéria e convencer a sociedade do projeto. “ É vender o peixe”.

     Já a prova que seleciona inúmeros jovens do ensino médio, o Enem vai continuar existindo é o que se deseja. Agora a mudança esta duração do exame (muito extenso) é que se fala do ministério. Agora estão negociando outras formas de exames para adentrar na Faculdade. O pré-vestibular continua. Ele possui uma rede muito forte, confirma Boamoerte.

      Luana Boamorte, presidenta do conselho diz que a reforma vem como nascimento para democratizar e
qualificar essa oferta. Se dará certo só o processo nos dirá, há muito a caminhar.

      O professor Fabiano Oliveira de Letras considera que essa reforma implica em preparação ao longo dos anos. “É uma coisa ampla, complexa, pois mexe com profissional, a família, a estrutura da escola, o corpo da sociedade. Então ela mexe com todo mundo. ”

Alunos e professores de São Cristóvão debatem reforma

Por Fernanda Roza

Com a justificativa de deixar a escola mais atraente e aumentar o desempenho dos estudantes brasileiros, o Presidente da República, Michel Temer, sancionou no último dia 16 a medida provisória (MP) do novo ensino médio, que visa flexibilizar o currículo escolar, ampliar a carga horária e reforçar o ensino profissionalizante.  Mas, apesar dessa reforma só ser colocada em prática em 2019, debates e críticas estão sendo geradas por professores e alunos desde setembro do ano passado, quando ela foi apresentada ao Congresso Nacional no formato de medida provisória.

Estruturar para integralizar

A reforma prevê a adoção do ensino médio em tempo integral e o aumento da carga horária. Com isso, o governo pretende investir 1,5 bilhão de reais para atingir, em alguns anos, a meta de 50% das escolas integralizadas.

Segundo Christian Lindberg, doutor em educação e professor de Filosofia da Universidade Federal de Sergipe (UFS), a falta de estrutura será o principal problema no processo de integralização das escolas, pois o recurso que será implementado na medida provisória não é suficiente. Além disso, há a PEC 55, que diminui alguns recursos em investimentos primários, entre eles, a educação. “Então, como você promete ampliar o número de vagas em tempo integral, se não dá condições materiais para que essas vagas sejam preenchidas no que se diz respeito à estrutura física? ” Questiona o professor.

Aqui em Sergipe, uma das principais preocupações da comunidade escolar é justamente essa, a falta de estrutura. Esse problema, por exemplo, vem causando diversas discussões no Colégio Estadual Prof. Hamilton Alves Rocha, localizado no bairro Eduardo Gomes, que a partir de abril passará a ter, com o ‘ensino inovador’, o horário integral.
Colégio Estadual Prof. Hamilton Alves Rocha

Para o diretor dessa instituição, que preferiu não se identificar porque está apenas há 20 dias no cargo e não tem muito conhecimento sobre a mudança, o principal empecilho é a infraestrutura, pois a escola não tem um bom refeitório, um bom espaço, laboratórios, etc para segurar os alunos durante o dia inteiro. “O ensino integral em si não é algo ruim, mas é preciso dar todas condições aos alunos”, observa.

É por esse motivo que Isabel Cristina, professora de Geografia e Sociologia do Colégio Estadual Armindo Guaraná, situado no Rosa Elze, São Cristóvão, acredita que para se implementar o ensino integral as escolas precisam ter, no mínimo, bons refeitórios, banheiros em boas condições, quadra multi esportiva e uma boa área de lazer.



Colégio Alternativo
Douglas Fonseca, coordenador do Colégio Alternativo, localizado no Bairro Eduardo Gomes, São Cristóvão, tem um pensamento parecido com o o dela. Para ele, deve haver uma reforma, mas não agora, pois nem toda escola está preparada para receber o impacto que virá com esse novo ensino. “Nós temos estrutura, mas nem toda escola pública tem, temos que pensar nisso. Se não colocar algo atrativo, o aluno não vai querer ficar na escola”, explica.

Assim também pensa o aluno de Engenharia Civil da Universidade Federal de Sergipe Wesley Santos, 19, afirmando que, antes de implementar uma escola integral, deve-se pensar, primeiramente, no que o aluno irá fazer durante o dia inteiro. “Se você não tem uma escola atrativa, com cinema, quadra, biblioteca, laboratório de informática e ciências, você não vai querer ficar o dia inteiro nela. Então, essa reforma no momento não é viável por questões de estrutura”, conclui.

Sendo mais objetivo, Christian Lindberg disse que, conforme os dados do censo Escolar 2016, só 51% das escolas públicas de ensino médio do Brasil têm laboratório de Ciência. “Então, como é que 49% das escolas oferecerão o sistema informativo itinerário de ciências da natureza, por exemplo, se não tem laboratório?! É muita falta de estrutura”, diz o educador.

Flexibilização ou empobrecimento de conteúdo?

A ideia do governo é que o aluno estude 60% da carga horária obrigatória da Base Nacional Curricular comum  (BNCC) e possa, a partir do segundo ano, escolher qual área do conhecimento deseja estudar: linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas e formação técnica e profissional, presente nos 40% restante. Mas essa proposta está causando diversas opiniões entre as pessoas,    

Alunos do Colégio Estadual Glorita Portugal
Thalita Oliveira, 15, que cursa o primeiro ano do ensino médio no Colégio Estadual Glorita Portugal, em São Cristóvão, bairro Eduardo Gomes, fala que as propagandas da TV só mostram coisas boas, mas ninguém sabe ao certo como será. Para ela, flexibilizar a grade parece ser algo ruim, pois para fazer o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) é preciso o domínio de todas as áreas. Confusa diz: “Na verdade, eu ainda estou meio a meio... eles querem a gente desinformados”.

Alunos do Colégio El Shadday 
Com um pensamento parecido, a aluna do Colégio El Shadday  Vitória  Haritchely, 16,  que está no segundo ano, diz que não concorda com essa mudança. Indignada, retruca: “O ENEM é um exame interdisciplinar, mas na escola, eles vão dar prioridade a algumas matérias e deixar outras de lado, sendo que a gente vai precisar de todas elas no futuro”.

Islayne Santana, estudante do ensino médio do Colégio Alternativo também é contra a flexibilização das disciplinas. “Esse ponto é complicado porque não vai ser mais obrigado estudar História, Geografia, Física…. Querendo ou não, os estudantes vão receber um conhecimento a menos em relação ao que é ofertado hoje”, comenta.

Em contrapartida, para o aluno Micael Alves, que estuda o 1° ano do ensino médio no Glorita, escolher a disciplina é algo bem legal, porque ele não precisa pegar disciplinas que julga desnecessárias, como por exemplo, Filosofia. “Não acho Filosofia algo atraente e nem tenho interesse em aprendê-la, se não fosse ela, eu não estava de recuperação agora”, confessa.

Para Moisés Cruz, atualmente estudante de Filosofia da Universidade Federal de Sergipe, mas prestes a ingressar no curso de Sociologia, a escolha das disciplinas pode influenciar na escolha do curso sim. “Atualmente faço filosofia, mas mudei para Sociologia. Porém, no primeiro ano do ensino médio, eu queria ser um engenheiro naval, então, provavelmente, investiria “pesado” em exatas. Logo, não estaria estudando humanas”, esclarece.

O educador Christian argumenta que, se no ensino superior, principalmente no primeiro ano, os alunos desistem do curso por questões de afinidade, imagine antecipar essa tomada de decisão para o segundo e terceiro ano do ensino médio. “Há uma tendência de o aluno optar por aquilo que ele não quer”, complementa
Já Wesley Santos diz que a flexibilização das disciplinas não iria mudar a sua opção de curso, pois era um desejo que já existia dentro dele. Mas tem consciência que não é certo a retirada de algumas disciplinas. “ A inteligência não pode ser vista de uma única e exclusiva forma, temos que olhar no geral”, argumenta o futuro engenheiro

Conforme Edilton Rodrigues, professor de Biologia do Colégio Alternativo, à flexibilização do currículo também não é algo tão  negativo. O mais grave é não saber o que os alunos e professores pensam a respeito do assunto…”Porque eles vão mexer nos conteúdos e cortar alguns assuntos . Logo, será eliminado um pouquinho dali e um pouquinho daqui. Mas será que esses assuntos não são assuntos importantes para o crescimento intelectual/profissional do estudante? Por isso a importância de um debate”, reforça.

Dessa forma, de acordo com Lindberg, o estudante não terá o direito de conhecer todos os conteúdos disponíveis hoje. A tal da liberdade de escolha tem vários limites para ele usufruir dela e, mesmo ele usufruindo dessa liberdade, ele pode escolher algo errado e ser punido, futuramente, por essa escolha. “No ponto de vista pedagógico conceitual, é de uma perversidade muito grande alguém ter concebido essa ideia”, acrescenta o filósofo e educador.

É por isso que Cristiano Gomes, professor de Artes do colégio Alternativo,  diz não ser louvável a ideia de o aluno escolher as disciplinas, porque poderá gerar uma empobrecimento de conhecimento, principalmente quando chegar à Universidade. Além disso, essa suposta liberdade de escolha, pode prejudicar a direção vocacional do aluno brasileiro. “Tirar a Artes, Sociologia e Filosofia ou fechá-las como opção, jamais” , diz.


Qual a didática do “notório saber”?

Com a reforma, o governo possibilitará, ainda, a contratação de professores com “notório”saber. Assim, pessoas sem formação superior poderão lecionar, basta ter algum tipo de experiência profissional.

Quando questionada sobre esse assunto, a estudante Vitória Harichely responde: “Qualquer pessoa ensinar? Isso não pode ser assim, vai findar acabando com o curso de licenciatura.  Não basta a pessoa ter bacharel, ela tem quer ter licenciatura, didática.. saber lidar com as pessoas”.

Para Edilton Rodrigues, do Alternativo, os “professores de “notório saber” é outro caso a se pensar: “Será que essas pessoas com um suposto saber terão didática para passar o conteúdo  para os alunos? Será que ela vai saber avaliar? Se não, nada vai adiantar, a aprendizagem dos alunos será prejudicada. É preciso um curso para capacitar essas pessoas”, questiona o biólogo.

O coordenador do Alternativo, por sua vez, fala que esse assunto  precisa ser melhor explicado, porque essa implementação vai de encontro até com as universidades. ‘’Tudo bem, a pessoa pode até dominar determinado assunto, mas não terá didática, não tem a parte pedagógica e até mesmo um saber científico’’, pondera.

    A professora Isabel Cristina acha que esse notório saber é uma forma de acabar com os cursos de licenciatura e arrumar apadrinhados. Quem vai mensurar quem tem mais saber do que outro para ensinar? “ Você pega um advogado para ensinar português, porque ele escreve bem. Mas aí  eu paro para analisar, será que esse indivíduo saberá passar os conteúdos? Será que ele estudou a psicologia da aprendizagem ou didática?”, questiona.

Da mesma forma, a docente de língua portuguesa Vanessa Rezende, da Escola Estadual Elísio Carmelo, instituída na cidade de São Cristóvão, indignada fala: “Chega a ser ridículo uma pessoa sem licenciatura, apenas com um “notório saber “ensinar, mesmo que seja apenas no ensino técnico. 

Segundo o professor Christian Lindberg, da UFS, porém, a legislação já permite que profissionais com notório saber ministrem  conteúdos nas escolas técnicas. Desde, é claro, que eles façam uma capacitação pedagógica. Isso funciona da seguinte maneira: “é um engenheiro de saneamento que vai dar aula de saneamento básico para o curso técnico em saneamento. ‘’Nós não temos licenciatura em saneamento, nesse caso, é útil. Então, o notório saber, até a medida provisória, existia para atender esse profissional e resolver essa demanda das escolas técnicas. A medida provisória deve manter esse espírito”, explica.


Principais críticas

O professor de biologia do Alternativo contou que o mais grave dessa medida é o fato de a sociedade, principalmente os professores, não ter sido consultada sobre como essa reforma deve ser e para que ela deve ser. “O que eu acho mais grave é isso, a camada lá em cima decidindo tudo sem saber a opinião da gente”, conta o biólogo.

Enquanto para Christian Lindberg, de fato era preciso fazer alterações no atual modelo de ensino médio, entretanto, a forma como essa modificação aconteceu, desconsiderou toda a discussão que vinha sendo cravada desde 2012 pelo Congresso Nacional da educação.

Com essa reforma, o coordenador Douglas Fonseca afirmou que a mensalidade da escola particular irá, possivelmente, sofrer um aumento, pois é uma demanda que a escola ainda não tem. E mais do que isso, com o aumento da carga horária, os professores vão trabalhar mais e, consequentemente, o seu salário deverá ser retribuído por isso.

Conforme o professor Christian, mesmo que governo tenha se espelhado em experiências de outros países, a reforma posta aqui é muito mais ‘radical’. Preocupado, ele diz: “Nós vamos sair de 13 disciplinas obrigatórias para três. No mundo inteiro não é assim , lá fora o conteúdo mínimo não é tão mínimo como será no Brasil”.

Então, “o direito ao conhecimento que todo jovem tem, vai ser liquidado e diminuído, porque eles só vão ter domínio de conteúdo vinculado a português, matemática e inglês. Nesse aspecto, a lei é e extremamente prejudicial ao aluno”, explica Lindberg.

O ensino integral no centro da polêmica

Por Letícia Sandes

Uma das propostas da lei que reformula o ensino médio brasileiro é investir 1,5 bilhão de reais para que em até cinco anos metade das escolas sejam de período integral, mas alterar a carga horária já é algo que entra em vigor a partir de 2019. O tempo de estudo vai aumentar de maneira gradual, das atuais 800 horas para 1000 horas-aula anuais até chegar a 1400 horas.

Em Sergipe, essa situação vem ganhando uma grande repercussão, principalmente entre a comunidade escolar, ainda mais levando em consideração o projeto de Ensino Inovador que está sendo proposto para algumas escolas pelo governo do Estado (coincidentemente, também do PMDB). Ensino este, que consiste em transformar a carga horária de estudo para tempo integral.

O atual diretor do Colégio Estadual Prof.  Hamilton Alves Rocha, localizado no bairro Eduardo Gomes, na cidade de São Cristóvão,  que não quis se identificar por razões pessoais, conta que os poucos dias de sua recente gestão do colégio, têm sido muito conturbados, pois o Hamilton tem apenas 30 dias para ser adaptado ao ensino em tempo em integral e  não possui qualquer estrutura para isso.
O Colégio Hamilton está recebendo o Ensino Inovador sem qualquer alteração de estrutura.  

A infraestrutura é realmente um grande problema. O professor aposentado Elizeu Carmelo, que lecionou em São Cristóvão durante toda a sua carreira, diz que a cidade não possui estrutura alguma para abrigar os alunos o dia todo, “ Não vai ter vagas para todos os alunos passarem o dia todo na escola, isso é mais uma utopia” , diz.

Colégio Alternativo.
Douglas Fonseca, Coordenador do Colégio Alternativo, também no bairro Eduardo Gomes, acha que o país não está preparado para essa reforma. Ele acredita que as escolas da rede privada têm capacidade para receber os alunos em tempo integral, mas concorda que as escolas públicas do Estado não teriam estrutura. Para ele, o problema que afetará a rede privada está na atratividade desse ensino “Se for colocado aula tradicional pela manhã e aula tradicional pela tarde, o aluno vai correr da escola. Seria preciso um modelo na qual o aluno quisesse estar na escola e não se sentisse obrigado”, comenta Douglas.

Se entre os gestores e professores essa reforma pode gerar diversos conflitos, não seria diferente com os mais afetados nessa história, os alunos. Gabriela da Costa, aluna do Colégio Estadual Dep. Elísio Carmelo, da cidade de São Cristóvão, se preocupa muito com isso, pois segundo ela, pode afetar o seu emprego “ Se houvesse ensino o dia todo, eu teria que escolher ou a escola ou o trabalho”, explica.
No Elísio Carmelo o que predomina é o problema da estrutura.

Para Fábio Feitosa aluno do Elísio Carmelo, essa medida não é boa, “tem colégio que não têm estrutura para isso”, reforça ele. O mesmo afirma que o problema da estrutura não tornaria viável a escola na qual ele estuda ser integralizada.

Já para alguns alunos do Colégio Alternativo, estudar o dia todo não parece ser algo ruim, Arielly Barboza, que está cursando o 3° ano acredita que pode ser bom se for colocado da maneira certa. A questão é ,que maneira certa seria essa?

Gustavo Santana que também cursa o 3° ano no Alternativo acredita que ficar mais tempo na escola permite mais concentração nos estudos “Em casa, o celular vibra, você corre para olhar, então seria bom sim”, reforça.

Flexibilizar ou limitar?

Para chamar atenção dos jovens, o governo vai possibilitar, a partir do segundo ano, que o estudante escolha determinadas disciplinas referentes às seguintes áreas: Ciências Humanas, Ciências da Natureza, Ciências Sociais e Aplicadas, Matemática e curso técnico e profissionalizante.

Joana Stefanie Silva, aluna do Elísio Carmelo, acredita que escolher as disciplinas é algo bom. “Ah, eu acho legal porque tem muita gente que vai se especializar em uma área que não precisa, então seria bom”, argumenta.

 Já para Fábio Feitosa, não é algo muito viável, pois, significa menos estudos: “pra quem não gosta de estudar é bom”. O aluno ainda acredita que isso pode separar ainda mais o ensino da rede pública da privada, já que as escolas privadas terão maior possibilidade de ofertar todas as disciplinas e a escolas públicas, não. “Os alunos da rede privada vão estudar tudo, então se a gente for competir com eles não vai ter como”, comenta.

Arielly Barbosa, que aos 15 anos está cursando o 3° ano, acha que é importante o conhecimento de todas as áreas, independentemente da profissão desejada. “Se fosse para escolher, eu particularmente escolheria todas porque como a gente, que está no ensino médio não tem certeza do que vai escolher (curso superior), todas são importantes” comenta a aluna.

O professor de Educação Física do Colégio Alternativo Elder Correia também acredita que os estudantes não têm condições de escolher o que querem estudar “O ensino médio já especializa demais o sujeito, onde limita seu pensamento, então isso tende só a piorar. Não sei se o aluno tem capacidade de fazer essas escolhas”. Elder ainda dá o seu exemplo:  “Quando entrei na Universidade eu tinha uma cabeça, depois que saí de lá tenho outra completamente diferente”

Gabriel Silva, estudante de Física da Universidade Federal de Sergipe (UFS), tem um pensamento mais radical a respeito dessa tão conturbada liberdade de escolha. O futuro físico acredita que é uma forma de corte de conhecimento, porque as escolas públicas não serão capazes de ofertar todo o leque de disciplinas optativas. Gabriel traz também um ponto muito importante, que é o acesso à Universidade, pois se forem ofertadas apenas algumas disciplinas, o aluno fica restrito em sua escolha e até impossibilitado se não houver uma mudança no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). “É uma estratégia do governo para retirar o acesso dos jovens”, comenta o universitário.

A professora de História Luziane Santos, que atualmente está afastada das salas de aula para dedicar-se ao seu mestrado, revolta-se ao falar do assunto, alegando que a reforma é ridícula. “No caso de História e Geografia, o conhecimento fica reduzido a apenas uma área do saber. Vejo que cada vez mais os governantes querem que a população seja irracional e não tenha criticidade e opinião própria para avaliar os erros do passado” diz Luziane. Para ela, tudo isso não passa de um grave retrocesso educacional.

Glícia Souza, aluna do Colégio Alternativo, se preocupa com nível de conhecimento que os alunos terão. A estudante diz que mesmo as escolas particulares podem não oferecer todas as áreas devido à crise econômica brasileira. Para ela, apostar em uma mudança tão radical assim, em um momento em que o Brasil está em um conflito financeiro, é uma espécie de “tiro no escuro”. “É melhor investir em algo que já está estabelecido do que em algo que não se sabe se pode dar certo” argumenta Glícia. A estudante ainda reforça que os alunos terão carência de conteúdo pois receberão conhecimento a menos. “Isso vai gerar um conflito” diz.

O coordenador da escola de Glícia, Douglas Fonseca, traz também uma questão muito importante, a contratação de professores. Segundo ele, alguns professores poderão ser afetados com isso, caso a escola não oferte todas as áreas, porque nesse caso a demanda de empregos para esses professores será menor. “Alguns professores vão sofrer um pouco mais, por causa das disciplinas opcionais” comenta.

Alunos reclamam da falta de informação

por Joyce Oliveira

A lei 13.415/2017, também conhecida como lei do novo ensino médio, já em vigor, pretende ser uma resposta aos baixos resultados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), que revelou a média de 3,7 no ensino médio brasileiro, patamar estagnado desde 2011. Trata-se, resumidamente, da mudança na grade curricular e do desenvolvimento do ensino médio integral.

Foi um processo polêmico em muitos pontos, desde as suas determinações ao instrumento escolhido para sua tramitação. Medidas provisórias são utilizadas em casos de urgência e relevância, já produzindo efeitos imediatos. Entretanto, possuem vigência de 60 dias, que podem ser prorrogáveis uma única vez por igual período, para passar pelas votações e serem sancionadas.

A norma foi sancionada, mas a mudança não começa agora e de acordo com Maria Helena Guimarães de Castro, secretária executiva do Ministério da Educação (MEC), e não são obrigatórias. As unidades escolares que optarem pelo sistema terão até o final de 2018 para implantar o novo ensino.

A legislação vem em um momento de grande agitação política. O país se depara diariamente com vários escândalos de corrupção e delações, acabou de sair de um processo de impeachment, o novo governo tem altos índices de rejeição e há pouco aprovou a PEC-241, marcada principalmente pelo congelamento dos investimentos nas áreas prioritárias como saúde, educação. Soa controverso que, justamente após anunciar um corte nos investimentos, anuncia-se um projeto que precisa de muitos recursos, não só para adaptação estrutural das unidades escolares, como para o aperfeiçoamento dos professores e contratação de novos profissionais. Segundo Mendonça Filho, Ministro da Educação, serão investidos 1,5 bilhão de reais nos próximos dois anos para apoiar a fundação de unidades de ensino integral nos estados.

Para entender a complexa reforma do ensino é preciso analisá-la ponto a ponto. O Portal Brasil explicou as implicações mais relevantes da reforma.

A carga horária mínima anual será ampliada gradualmente para 1.400 horas.
O Plano Nacional de Educação prevê que até 2024, 50% das escolas possuam ensino integral
A grade curricular do Ensino Médio passa a ser dividida entre: disciplinas obrigatórias e as optativas, sendo a escolha da grade feita pelo aluno.
O currículo básico não pode ultrapassar 1.200 horas por ano e a parte optativa deverá conter conteúdos históricos, econômicos, sociais, ambientais e culturais da região.
O aluno poderá optar pela formação técnica profissional, com aulas teóricas e práticas.
As disciplinas cursadas no Ensino Médio passam a contar como créditos para o Ensino Superior.
Professores com notório saber e habilidades comprovadas podem ser contratados.

Muitos são os argumentos contrários. Os professores, por meio dos órgãos de classe, se manifestam contra a lei, apontada como autoritária pela falta de participação e debate com os docentes. O horário estendido na escola exige fisicamente: estrutura adequada; alimentação equilibrada; mais profissionais, de professores à equipe de serviços gerais. Outro questionamento é quanto às disciplinas ofertadas. Todos os alunos, sejam de escola pública ou particular, terão os mesmos direitos? Ou essa noção de escolha é falsa? Diante das obscuridades da legislação e do silêncio do governo, o debate continua.

Desconhecimento e dúvida dos alunos

Jefrey Silva sente-se inseguro pela falta de informação
Foto: Joyce Oliveira
Jefrey Silva, 18 anos, aluno do 2º ano do ensino médio do Colégio Estadual Dom Luciano José Cabral Duarte, diz não ter muitas informações sobre o novo ensino: “Só sabemos que vai ter ensino integral e para isso precisa de uma estrutura melhor, vestiários para os alunos, almoço. Muitos colégios não têm estrutura para isso. Aqui mesmo não tem estrutura e já falaram que não dá para reformar”. O colégio realizou uma palestra apresentando as informações mais conhecidas sobre a reforma do ensino, mas as dúvidas dos alunos permanecem.

Os alunos reclamam da falta de informação precisa e tentativa dos professores de influenciá-los. Mariana Novais, 17 anos, aluna do mesmo colégio, disse que praticamente todas as informações que tem são do Grêmio Estudantil da Unidade, “Eles só dizem que precisamos ser contra, que é ruim. Não explicam muita coisa. Os professores também só falam mal, criticam. Foram eles que informaram a gente, os alunos. Ninguém explica direito”.

Outro questionamento dos estudantes se deve à escolha das disciplinas. Os estudantes não se sentem preparados para definirem um caminho tão cedo. “Ano que vem entro no 3º ano e ainda não sei qual profissão seguir, imagina se tivesse tido que escolher lá atrás”, disse Jefrey. Os alunos da rede pública temem que as medidas funcionem apenas nas escolas particulares e o já precário ensino público fique mais deficitário.

Entretanto a mudança assusta também os alunos da rede particular. Dayna Santos, 15 anos, 1º ano do ensino médio de um colégio particular da zona sul da capital, se diz receosa com as transformações, “São muitas mudanças acontecendo. Antes era vestibular normal, aí veio o Enem e mudou tudo. Toda hora mudam uma coisa e parece que fica mais complicado. Os professores falaram um pouco, mas eles também dizem que não sabem muita coisa. Tem que esperar”.

Os educadores acreditam que os processos seletivos, como o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), também sejam modificados com as alterações do ensino. As modificações são muitas, os esclarecimentos, poucos, mas as opiniões são muitas.

Todos os professores contra? 

Fabiano Oliveira acredita que a mudança é necessária
Foto: Joyce Oliveira
A classe docente parece bem unida na posição contrária, contudo alguns profissionais se mostram abertos a mudança que consideram necessária. Fabiano Oliveira, professor do Colégio Estadual Dom Luciano José Cabral Duarte, é um deles, “O que é desconhecido pode assustar um pouco. O fato é, a nossa educação tem um currículo do século XX que não satisfaz mais as necessidades do país. Nós, professores, não somos convidados a participar dessas discussões e por isso há a rejeição da medida, que deveria partir justamente da classe docente. Historicamente, os ministros da Educação são pessoas ligadas à outras áreas, geralmente economia, administração, sendo que deveria ser um educador. A proposta educacional é do ponto de vista pedagógico muito boa, mas e do ponto de vista político, econômico? Requer uma estrutura não só física, como curricular”.

Apesar de Fabiano trazer um contraponto, a opinião de grande parte dos professores é a mesma de Edson Dias, professor de História na rede pública e particular de ensino de Aracaju, que se mostra contrário à reforma, “Acreditar que os alunos, aos 14 ou 15 anos, estarão preparados para definir uma área de aprendizado é totalmente equivocado, quando muitas vezes eles não conseguem fazer tal escolha nem após a conclusão do ensino médio. Quanto ao currículo, é preocupante como será implantado principalmente se considerarmos as diferenças entre a rede particular e pública. Falar de ensino integral na rede pública com a estrutura que temos hoje é uma falácia. Sem dúvidas, as escolas particulares vão se adaptar mais. Inclusive os grandes financiadores dessas medidas foram grandes grupos educacionais”.

Debates

Na última semana, dia 3, uma audiência pública foi realizada na Assembleia Legislativa de Sergipe, para debater o tema com a presença do educador e filósofo Gaudêncio Frigotto. O especialista pontuou que a medida é autoritária e ressaltou: “é uma reforma contra os pobres. Para estender a jornada de ensino do jovem pobre ele precisa de uma bolsa ou terá que trabalhar para ajudar nos gastos de casa e não poderá acompanhar o ensino”. O ensino médio técnico também foi criticado, “ estão querendo fazer um fast-food da educação com esses cursos rápidos”.
Apesar de estarem presentes na audiência e serem consultados, nenhum membro da Secretaria de Educação do Estado, nem da Secretaria de Educação Municipal de Aracaju, quis se manifestar sobre a medida.

Divulgação do governo

Na tentativa de receber aceitação popular, o governo federal realiza uma expressiva campanha de marketing. Anúncios foram veiculados em todos os canais, principalmente nos horários nobres, um investimento de milhões. Fato que gera mais estranheza considerando a atual crise econômica do Brasil.

Outra divulgação controversa se deu com a contratação de Youtubers, sem qualquer qualificação, para explicarem aos jovens o que é o novo ensino médio sem citarem que foram pagos para tal. As ações publicitárias têm sido vistas com o intuito de ludibriar os jovens e encantá-los com a falsa sensação de escolha.


Fontes documentais:
http://www.brasil.gov.br/educacao/2016/09/entenda-o-novo-ensino-medio
http://exame.abril.com.br/brasil/temer-anuncia-reforma-do-ensino-medio-assista/
https://novaescola.org.br/conteudo/4702/secretaria-executiva-do-mec-esclarece-pontos-do-novo-ensino-medio
https://www.cartacapital.com.br/revista/926/reforma-do-ensino-medio-e-ataque-frontal-a-docencia

Quem ganha, quem perde com as mudanças

Por Larissa Valença

A série de medidas que reformularão o modelo de ensino atual já foi aprovada e entrará em vigor quando a Base Nacional Curricular Comum (BNCC) for definida. Contudo, mesmo com o fato de as mudanças já estarem em andamento  não quer dizer que foram aceitas integral e massivamente.

O movimento que luta contra a correnteza é enorme, basta falar com os diretamente afetados, professores e alunos, para percebê-lo. Inclusive, dos 78.076 votos  computados na página do Senado Federal, 4.551 foram a favor e 73.565 contra a Medida Provisória. E é desse cenário conflitante que nos falam as diversas fontes entrevistadas no município de Aracaju. A falta de diálogo com a sociedade é uma das principais queixas da categoria  docente e envolvidos na educação. 

“É uma coisa que já veio imposta. A gente soube através das propagandas que apareceram na televisão, que já estava certa, que já estava pronta. Não há discussão com o docente. Colocaram para discutirmos uma Base Nacional Curricular Comum, a BNCC, que essa sim ainda está em andamento. No entanto, por trás, estavam fazendo essa Reforma no Ensino Médio. Quer dizer, o que diz que é mais urgente, que é discutir  com os profissionais da área, não foi discutido. E de repente: Reforma do Ensino Médio. Eu confesso que me assustei quando eu vi porque eu soube pela televisão, aí tive que ir atrás para me informar”, diz Danielle Barboza, professora de Português do Colégio Estadual Joaquim Vieira Sobral, localizado no Bairro Jabutiana, zona Sul de Aracaju, sobre como ficou a par da reforma. A professora concorda que toda a educação precisa de reforma, porém não com ênfase nesses pontos e nem dessa forma que foi conduzida. 

O professor de Filosofia do Nossa Escola Roger Soares compartilha da mesma experiência de Danielle, mas considera que houve sim debate. Quando lançada a proposta de construção da BNCC no Portal, desde julho de 2015 e aberta à contribuições do público, em setembro do mesmo ano. Em março de 2016, a consulta foi concluída, com mais de 12 milhões de contribuições. “Na minha visão, trata-se de um processo extremamente democrático que foi dificultado por conta de uma ideia de caráter emergencial da reforma. Uma medida emergencial que não se justifica em si mesma. O próprio Plano Nacional de Educação já tinha como objetivo determinar diretrizes, metas e estratégias para a política educacional dos próximos dez anos”, encerra Roger.


Direito à Educação

O PNE foi apresentado pela então presidenta Dilma Rousseff em 2010 e sancionado em 2014, após quatro anos de discussões, revisões e audiências públicas com participação  de atores governamentais, instituições de educação, representantes da comunidade educacional, entidades científicas, diversas redes de movimento como a ‘Campanha Nacional pelo Direito à Educação’ e ‘Todos pela Educação’, membros da sociedade civil e membros da sociedade civil vinculada ao setor privado na área educacional. Portanto, suficientemente debatida, ao contrário da MP, que infelizmente impediu estudantes de participarem da audiência pública (09.11.2016), só liberando a entrada após mais da metade de andamento da conferência e, mesmo assim, aos estudantes não foi dada a fala.

No site da União Nacional dos Estudantes (UNE) os estudantes do movimento se posicionaram sobre: “Após insistência, a presidenta da UNE foi liberada para participar da mesa. Na sua fala, ela apelou para uma reforma do Ensino Médio discutida com todos os setores da educação, incluindo alunos, e respondeu à ironia do presidente ilegítimo Michel Temer, que um dia antes havia declarado que os alunos que ocupam escolas não sabem o que é uma MP.”

Vale lembrar que o PNE é decenal, ou seja, ultrapassa governos. Além dele a Lei de Diretrizes e Bases (LDB), sancionada em 1996, também sofre afrontas. Sancionada pelo Ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, estabelecia o currículo obrigatório da educação básica e articulava o ensino médio à formação técnica e profissional. Ambos já estabeleciam diretrizes para a educação, logo, muitas das medidas da Medida Provisória já estavam previstas.

Mais um dos professores que conheceu a proposta de reforma pela televisão, Arivaldo Montalvão é professor de Sociologia do Colégio Estadual Governador João Alves Filho, localizado no bairro Salgado Filho, que inclusive aderiu ao tempo integral, e também cita a lei quando defende que não houve debate. “Quando a gente fala que não houve debate, é na forma da implementação do sistema dessa reforma. Se chamou algumas pessoas ligadas geralmente à grupos empresariais da educação para poder falar e debater sobre essa reforma, então, não foi discutido. Quando o governo diz: “ Ah, teve debate”, teve, porque se a gente retomar a LDB e o PNE, tudo isso está previsto. Agora, a forma como se faz, como é que isso vai se implementar é que não tem debate (...) Nós professores, que estamos na sala de aula realmente não somos escutados”, fala .

O professor cita ainda as outras decisões que atingem direta ou indiretamente o novo ensino médio. A PEC 246 ou do Teto dos gastos públicos foi promulgada no dia 13 de dezembro do ano passado e impõe limite dos gastos públicos, congelando os gastos em 20 anos, e alterando assim o financiamento da saúde e educação brasileira. “Para você fazer a reforma do ensino médio como eles querem, você precisa ampliar recursos.  Só que como é que você vai ampliar recursos se você tem uma PEC que congela  gastos ?”.

Professores descartáveis 

Outra mudança polêmica é a liberdade de contratação para profissionais com ‘notório saber’ para o ensino técnico e profissional ou trabalhadores graduados que tenham feito complementação pedagógica, segundo artigos IV e V do texto final da MP.

Como  esperado, a categoria docente não está nada satisfeita com a mudança. A professora do Colégio Estadual Joaquim Vieira Sobral Efigênia Barbosa, no bairro Jabutiana, questiona se o processo de ‘julgamento’ será efetivo “Quem avalia quem tem um notório saber tem um notório saber para dizer quem tem o notório saber?” - É curioso, no entanto, que a professora nomeia o novo requisito como “balela” mas, questionada sobre suas ocupações, se declara professora de História, Filosofia e Sociologia quando na realidade só tem plena licenciatura em História, de acordo com os Dados do Servidor disponível no site da Secretaria de Estado da educação de Sergipe (SEED) – “No Brasil você é advogado e assume a Secretaria da Saúde. Não que não tenha capacidade, mas, entre um médico e um advogado para assumir, em tese, o médico teria mais capacidade”. A professora se refere à José Almeida Lima, que é graduado em Direito pela UFS e já exerceu diversos cargos políticos. 

Amália Soares também é professora do Vieira Sobral, onde leciona Geografia e considera o “notório saber” como um retrocesso. “Justo agora quando o Brasil estava avançando, pela LDB, que hoje está vigente, tínhamos um prazo de 10 anos para que todos os professores em sala de aula tivessem licenciatura. Agora que estávamos conseguindo diminuir essa margem vem essa medida”, diz ela. Critica as propagandas que bombardeiam as televisões brasileiras taxando-as fantasiosas, para o puro convencimento dos alunos, e imediatistas, para que o aluno pense que as mudanças ocorrerão em um instante, em “um estalar de dedos”, como coloca a professora.  “É colocado que o aluno vai escolher o que ele quer estudar. Então, ele não gosta de Geografia, ele não vai querer estudar. Como se nós (professores) fôssemos descartáveis”, declara.

Exclusão de disciplinas, exclusão de direitos 

No texto original da MP, a alteração do inciso 1 do Ar t.26 dispõe que :” os currículos a que se refere o caput devem abranger, obrigatoriamente, o estudo da língua portuguesa e da matemática, o conhecimento do mundo físico e natural e da realidade social e política, especialmente da República Federativa do Brasil”. Ou seja, exceto Português, Matemática e Inglês (que será implantando desde o 6º ano do fundamental, segundo inciso 5 do mesmo artigo), as outras matérias seriam diluídas na Base Nacional Curricular Comum, não como disciplinas em si, mas conteúdos de uma área abrangente.
A exclusão das disciplinas gerou bastante revolta, professores, alunos e cidadãos resistiram às intenções da MP e, felizmente, surtiu certo efeito. No texto final, o encaminhado para sanção, finalmente são citadas as disciplinas descartadas. O Inciso 2 prevê que a BNCC  inclua obrigatoriamente ‘estudos e práticas’ de Educação Física, Arte, Filosofia e Sociologia no Ensino Médio.

 Danielle estranha essa decisão : “A gente acabou de colocar essas disciplinas. Tirou inclusive carga horária de português para colocar disciplina de Artes, Educação Física, a gente diminuiu carga horária de outras disciplinas”, afirma a professora de Português.

 Já para Paulo Lyra, de 18 anos, que terminou seu Ensino Médio no ano passado em escola particular, o que mudará é o foco do estudo, que será mais científico do que é hoje. Enxerga privilégios para o estudante do novo ensino: “acho muito interessante a ideia do aluno poder escolher a área em que estudará, acho fantástico, principalmente porque não é de imediato, mas depois de ter experiência”. Mas também vê prejuízos: “acho bom que houvesse possibilidade de escolher permanecer com o estudo ‘geral’ e a possibilidade das escolas ofertarem apenas algumas das áreas de estudo para os alunos eu não vejo com bons olhos, pois o aluno não terá verdadeira liberdade de escolha de seu estudo” . Conclui sua fala mostrando insatisfação tanto com o molde atual, que considera como exaustivo e ineficiente, quanto com o da reforma, que é incompleto. “Acho, na verdade, que seria melhor um terceiro molde”.


O coordenador do Colégio Jardins, no bairro Grageru, Demersom Moura, garante que  a escola está preparada para caso as mudanças realmente entre em voga. Contudo, não consegue enxergar na prática a Reforma: “ na escola particular temos condição, só não temos quem vai pagar porque o pai não vai querer assumir esse custo. O governo não vai querer arcar com o custo e tampouco o pai, que já faz muito pagando  escola particular para o filho, que é um direito nosso garantido na Constituição ter a educação de qualidade, que nós não temos.” diz o coordenador do Ensino Médio, e reafirma que os pais dos alunos se mostram bastante econômicos durante algumas reuniões em que foi discutido o tempo integral. “O problema não é ofertar o ensino integral, o problema é  você ter aluno em tempo integral. Você não pode pensar numa economia privada  e não trabalhar com números mínimos de alunos, tem que trabalhar com número que dê para pagar as suas despesas e ainda gere uma certa lucratividade. No caso do ensino integral no colégio particular depende muito da questão do aluno querer, do pai ter condições de  pagar”, explica o gestor.

Demersom questiona o que se fará com todo alunado que estuda em um turno. Afinal, com o tempo integral, não haverá mais divisão, como os alunos passariam a estudar em tempo integral se não há escolas o suficiente para absorver todo esse ‘excedente’?  
“O próprio governo está dando um tiro no pé porque ele não tem condições de ofertar o tempo integral, ele não consegue implantar nas escolas públicas, imagine com os particulares, que não vão conter esse prejuízo, não vão bancar esse custo por si só. Ao repassar para os aluno fica aquela questão : Quem aderirá a isso?”.
Por fim, critica a Reforma por considerá-la excludente: “ As escolas particulares terão condições, as públicas não. Será para poucos. Como o PRONATEC foi para poucos. E a maioria dos projetos  que se fazem na realidade não chega a atingir sua totalidade, acaba privilegiando  poucos, mas a sua grande maioria que é o público mais necessitado não chega a alcançar.”

Menos vagas nas Universidades, mais notório saber?

No dia 14 de outubro de 2016, foi publicada no Diário Oficial da União a Portaria nº 20, que trata diminuição de vagas em Universidades Federais e privadas. Antes, era necessário que as instituições seguissem uma série de procedimentos burocráticos, mas, com a alteração, ela ganham autonomia para a redução e só se faz obrigatório informar à Secretaria de Regulação e Supervisão do Ensino Superior (SERES), porém, para ampliar o número disponível todo o processo de documentos ainda se faz preciso. 

Tal medida parece estratégica quando promulgada após submissão da MP. Retirar recursos das Universidades para aplicá-los ao novo ensino médio sem necessidade de desembolsar mais dinheiro, agindo de acordo com a PEC do teto. Para Arivaldo, os recursos para o ensino em tempo integral seriam retirados das faculdades, dos cortes do Ciência sem Fronteiras.

“É um outro equívoco. Sem Universidade forte, não existe ensino médio forte. Onde é que se produz conhecimento?  Na Universidade. Se a  Universidade  não tem recursos,  não consegue funcionar, onde é que se forma professor?”. E relembra a defesa da junção do Ministério da Ciência e Tecnologia ao Ensino Superior:  Sem faculdade não existe Ensino Médio. Tanto é que no início do Governo Lula, quando Cristovam Buarque foi Ministro da educação, ele queria tirar as Universidades do MEC e passar para o Ministério da Ciência e Tecnologia. A base tem de estar forte, só que a gente imagina a base não como a Universidade, mas ela também faz parte da base, porque é lá que vai se formar o professor”.

Comenta ainda sobre a formação superior: “E ainda, com a inclusão do ‘notório saber’, qual será o estímulo às licenciaturas ofertadas? Eles dizem que o notório saber não é para o ensino médio, só para o profissionalizante, espero que realmente seja. O que já é complicado. A gente sabe que nossas licenciaturas já não são valorizadas na própria faculdade, então já cria um problema a partir daí”, questiona o professor.

Falta estrutura

Com a ampliação da carga horária do alunos, o ensino passará a ser em tempo integral, de 5 horas diárias para no mínimo 7. O aluno do ensino público passará a além de tomar o café da manhã na escola, almoçar, tomar banho, trocar de roupa, enfim faz- se necessária uma série de estruturas para suprir qualitativamente as demandas que se farão gritantes com o ensino em tempo integral. Sem contar que precisa-se de laboratórios, infraestrutura específica para o ensino técnico e seus respectivos instrumentos. 

Efigênia Barbosa, professora de História da Colégio  Estadual Joaquim Vieira Sobral, no Jabutiana, considera a integralidade  possível, porém, alega que as escolas não são preparadas para isso. Refeitório, vestiário, alimentação, essas são algumas coisas que cita como imprescindíveis na infraestrutura e que deixa claro não existir no colégios. “Não tem nem banheiro decente para meio turno, você imagine (se fosse integral). Como é que você quer que o aluno fique o dia todo para aprender, porque a intenção é aprender, né? No calor, porque as escolas não têm ar condicionado, e quando têm ventilador , assim que coloca, quebra, ou os mesmos alunos levam, às vezes.” 

Danielly Cardoso é estudante do 1º ano do ensino médio no Colégio Estadual Dom Luciano, no bairro São José, e fala com conhecimento de causa sobre a falta de recursos da escola: “O meu colégio já tem quadra, só teria de ser melhorada, mesmo assim, o tempo para reforma excederia o que o MEC propôs. Também temos refeitório, mas não disponibilidade de comida. É só o espaço, praticamente. A gente só come broa, às vezes arroz doce ou cachorro quente. No momento em que teve a greve, que a gente ocupou o colégio, a gente fazia comida lá, os próprios alunos faziam comida. Então, tem como variar comidas, mas não é o que acontece, porque a gente já viu muita comida entrando e ficando por lá. Já vimos entrar suco de caixinha, mas é muito raro consumirmos”.

 Ela fala ainda sobre o quanto as reformas para adequar o colégio atrasaria o ano letivo: “Demoraria muito tempo para providenciar isso e já estamos muito atrasados, provavelmente terá greve novamente”. A estudante se refere ao período em que as ocupações somadas às greves em protesto à PEC 55, à submissão da MP e contra às irregularidades na escola, além de outros problemas  que os alunos enfrentam com os professores, cita uma professora que falta bastante, “ o nosso professor de Sociologia só veio aparecer  no meio do ano, a gente ficou muito atrasado e ele também não faz muita coisa”

A SEED respondeu à reivindicação dos alunos em nota enviada ao Portal Infonet, esclarecendo que as escolas que adotarem o modelo de ensino integral receberão investimentos para  infraestrutura. Afirmam que o valor de R$ 457 milhões de reais nos próximos 10 anos será repassado às escolas que aderirem.  

O professor Arivaldo comenta sobre o investimento: “Você pode ver a nossa sala (e  aponta a sala de aula em que foi concedida a entrevista. Nela não há ventiladores, há muitas cadeiras e inclusive algumas em desuso no canto da sala), como é, nesse calor. Aí você imagine um menino ficar aqui das 7 da manhã até às 16 e 30 da tarde. Numa escola quente, numa escola que não tem estrutura para receber ele, ele não pode nem tomar um banho porque não tem vestiário. O próprio secretário da educação daqui do estado diz que essas reformas foram acertadas com o MEC, que serão feitas durantes três anos, para preparar toda a estrutura de escola”.

E traz ainda um questionamento mais que pertinente: “Só que quando será feito isso ? Em período de aula ? Vai suspender as aulas para fazer a reforma ? A gente não sabe o que é que vai acontecer, tem lá dizendo, mas a gente não sabe se vai acontecer na prática.”

Para convencer é só repetir

Desde que foi lançada a MP, em 2016, as mídias brasileiras são preenchidas de propagandas do novo ensino médio. Liberadas em horários estratégicos e repetidas quase serialmente, mostram pessoas bonitas, salas novinhas em folha e sorrisos de satisfação. Em uma delas um jovem levanta-se de sua cadeira e vai à frente da sala  explicar aos seus colegas, o que é o novo ensino. “Sabia que ela foi baseada nas experiências de diversos países? Países que tratam a educação como prioridade. E que ela vai deixar o aprendizado muito mais estimulante e compatível com os jovens de hoje?”, ele diz, enquanto na lousa são listados os supostos países que serviram como modelo, dentre eles: Coreia do Sul, Inglaterra, Portugal, França e Austrália. 

“País desenvolvido é uma coisa, Brasil é outra. No país desenvolvido, eles estão fechando as prisões. Aqui ‘tá’ soltando os presos porque não cabe mais”. Ela frisa a realidade do país, argumentando que não se pode comparar a nossa com outras que divergem tanto. Há, no mínimo cinco presídios em toda Sergipe ( ados de 2008 do  Departamento Penitenciário nacional) e apenas uma universidade, a Federal de Sergipe, que tem apenas polos em outros municípios. “Um país que constrói mais presídio do que universidades públicas tem algo de errado”, completa a professora de História Efigênia.

Danielly, estudante do ensino médio, conta que representantes da Secretaria da Educação foram à escola para apresentar o plano de mudanças aos alunos e inclusive deram testemunhos de sucesso em experiências que tiveram: “As duas que falaram mais, disseram ser professoras de Colégios Estaduais, que vieram da mesma faculdade, que fizeram juntas. Elas disseram que já tinham dado aula e que tinham sido alunas nesse tipo de colégio (integral). Disseram que tinham certas dificuldades, como a que nós citamos, porque teve bastante discussão com os alunos. Elas confessaram que foi difícil para elas mas garantiram que não seria mais assim pelo fato do dinheiro que vai ser repassado todo ano para o colégio”, para ela, foi uma tentativa de convencer, não de esclarecer, pois considera que foram exaltados apenas pontos positivos. 

A aluna ainda esclarece a causa da visita falando do  problema com a procuradora do alunado: “A representante dos alunos já teve contato com esse assunto antes da gente e não nos comunicou. Ela disse sim para uma coisa que a gente nem sabia como seria”.  Logo no início de 2017, em reunião com o Conselho Escolar, o Secretário da Educação Jorge Carvalho saiu com documentos em mãos que tratavam da aprovação do Dom Luciano quanto ao ensino em tempo integral, sendo que não houve consentimento da comunidade escolar, e no dia 10 de fevereiro, no Diário Oficial da SEED, sai o edital da seleção de professores para ensinar no novo modelo, constando o Dom Luciano como uma das escolas com vagas disponíveis. 

A suposta adesão causou revolta não só aos professores e alunos como também mães, pais e funcionários, que juntos elaboraram um abaixo assinado para deixar clara a sua recusa à implantação da integralidade.



Daí surgiu a visita das representantes, após a recusa e reprovação dos atos da gerência do Colégio. Um dia depois, os professores reuniram os alunos no auditório para uma outra votação, agora com os estudantes esclarecidos. “Muita gente estava ali para dizer não”, afirma Danielly. Naquela mesma tarde de segunda (13.02), os estudantes protestaram em frente à escola e no auditório. E no dia 15, foram em frente à SEED para dizer não ao modelo. Alunos do turno da manhã e tarde se uniram e lotaram 5 ônibus , todos pagos pelos professores. “Ficamos por pouco tempo (cerca de 2 horas), mas acredito que pelo fato de ter muitos alunos, chamou um pouco a atenção”, conclui a aluna.

Neste ano, o governo investiu no Youtube para convencer os alunos. Foram desembolsados R$ 65. 000 para cada canal contratado: Você Sabia?, Pyong Lee, Rato Borrachudo, Rafael Moreira, Malena e T3ddy. Todos possuem público jovem, que provavelmente está ou estará no Ensino Médio. O vídeo causou uma enorme repercussão, os inscritos do Você Sabia? reclamaram que o conteúdo não estava com a tarja que avisa o informe publicitário. Após as reclamações, os proprietários do canal incluíram no vídeo o aviso de publicidade. Desde outubro, até janeiro deste ano o MEC gastou R$ 13 milhões em publicidade, segundo apuração da Folha de São Paulo. Um tanto curioso: informação ou propaganda? 

 “Pobre é para trabalhar”

Em 2015 foi publicado o estudo ‘Juventudes na escola, sentidos e buscas: Por que frequentam?’, de autoria dos sociólogos Miriam Abramovay, Mary Garcia Castro, Júlio Jacobo Waiselfisz com apoio do MEC, FLACSO- Brasil (Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais) e OEI (Organização dos Estados Ibero-americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura). A pesquisa ouviu mais de 8 mil estudantes dos 15 aos 29 nove anos. Os resultados mostram que 58,8% dos estudantes brasileiros de ensino médio trabalham e estudam simultaneamente e apontam os principais motivos para o abandono (a tal da evasão escolar  utilizada como argumento pelo presidente Temer) sendo eles: a necessidade de trabalhar (28%), a família (20,6%) e a gravidez (11,1%).

Fica claro então, que temos aqui um impasse. O que fariam esses quase 60% de jovens que trabalham? Certamente os estudantes de escola pública não abrirão mão do trabalho, vivemos em uma realidade na qual o jovem realmente precisa trabalhar para complementar a renda de casa. Dinheiro mata fome, estudo não. Apesar de investimento a longo prazo,  a estudo fica menor quando há urgência de sobreviver.   

Amália, a professora de Geografia do Colégio Estadual Joaquim Vieira Sobral, no Jabutiana, crê que as medidas só se justificariam pela demanda econômica. “Se for mão de obra para o mercado de trabalho, aí se justifica, entre aspas, porque você vai botar uma massa para ser técnica. E a gente sabe que o alunado quando começa a trabalhar, e ele tem um curso técnico, dificilmente ele chega no ensino superior depois. Principalmente quem vem de camadas da sociedade menos favorecida.”

Rosane Delfina, professora de  Educação Física do Vieira Sobral, completa a fala: “Aí você coloca o ensino técnico para quê? Porque pobre é para trabalhar, é só para formar mão de obra para o mercado de trabalho, por isso está começando pelo ensino médio”.