1 de jun. de 2017

Novo Ensino Médio, à espera de 2019

Por Katiane Peixoto

O presidente da república, Michel Temer, sancionou no dia 16 de fevereiro a lei para reformulação do ensino médio. inicialmente o projeto foi apresentado como uma Medida Provisória (MP) que se trata de um instrumento com força de lei utilizado em casos de relevância e urgência. A reforma promove algumas alterações na carga horária e na estrutura curricular, com o suposto objetivo de atrair os jovens para a escola e mantê-los matriculados. Desde a sua tramitação, no ano passado, tem causado conturbações no país, como escolas e universidades ocupadas, protestos e diversas movimentações contrárias. Porém, a previsão é que até 2019 as propostas curriculares da reforma estejam efetivamente implantadas.

Segundo o Senado Federal, a reforma propõe uma modernização do ensino. Por meio da criação da Política de Fomento à Implementação de Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral, promove alterações na estrutura do ensino médio, a ultima fase da educação básica. “Amplia a carga horária mínima anual do ensino médio, progressivamente, para 1.400 horas. Determina que o ensino de língua portuguesa e matemática será obrigatório nos três anos do ensino médio. Restringe a obrigatoriedade do ensino da arte e da educação física à educação infantil e ao ensino fundamental, tornando as facultativas no ensino médio. Torna obrigatório o ensino da língua inglesa a partir do sexto ano do ensino fundamental e nos currículos do ensino médio, facultando neste, o oferecimento de outros idiomas, preferencialmente o espanhol”.

Além disso, permite que conteúdos cursados no ensino médio sejam aproveitados posteriormente no ensino superior, dando, assim, autonomia aos sistemas de ensino para definir as áreas de conhecimento definidas pela Base Nacional Curricular Comum (BNCC). “O currículo do ensino médio será composto pela BNCC e por itinerários formativos específicos definidos em cada sistema de ensino e com ênfase nas áreas de linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas e formação técnica e profissional”. 

A professora da rede municipal e estadual de ensino de Sergipe Enivalda Leite, 47 anos, licenciada em História, se posiciona radicalmente contra. “O conteúdo passa a ser discutido e determinado pelo Ministério da Educação sem nenhum debate com a academia, com os estudantes, com os pais e nem com os professores. De forma burocratizada e atropelada, o que vai, a partir daí, mecanizar a escola, priorizar o ensino técnico, e impossibilitar o ingresso dos estudantes da rede pública nas universidades”. Para a professora, a reforma tornará a escola excludente, o que vai implicar em um número reduzido de alunos e priorizar a formação técnica ao invés do conhecimento humano. “O governo atropela toda a concepção da escola, tentando implantar um modelo educacional que, na minha avaliação como professora, é de um retrocesso até o período militar. Ainda podemos dizer que se comparar, era mais avançado”.

O Governo Federal tem investido milhões de reais em publicidade - em tempos de cris e- juntamente com a Globo, meio de comunicação de maior acesso do país. Tem lançado diariamente propagandas em horário de maior audiência sobre o Novo Ensino Médio. Com o objetivo de camuflar o que a proposta traz, os valores gastos são altos, principalmente por passarem, com maior frequência, entre o horário do Jornal Nacional (20h30min) e a “novela das nove” (21h20min), o que custa, em média, entre R$ 708.000,00 e 715.000,00 a cada 30 segundos de execução.

Para Victor Fonseca, 17 anos, aluno do 3° ano do ensino médio do colégio particular Dom Bosco em Itabaiana (SE)a intenção do governo é alienar a população, mostrando que a proposta é boa, que traz benefícios e, de certa forma, silenciar a sociedade, para fazer a sociedade aceitar e parar com os protestos e ocupações, “fazendo essas movimentações perderem sua legitimidade”, afirmou o estudante.

Medida provisória e PEC 55

Para muitos, a Reforma do Ensino Médio se contradiz. Há pouco tempo atrás, no ano passado, foi aprovado a PEC 241, que congela os gastos com a saúde e educação pública do país por 20 anos. Em contrapartida, o governo torna lei a reforma do ensino médio. Como implantar um novo ensino limitando os gastos com a educação? 

Coordenador do Colégio Particular Dom Bosco
 se posiciona contra a reforma.
Para o coordenador do Colégio particular Dom Bosco, em Itabaiana (SE), Jaílton Oliveira Costa, 31 anos, o projeto de mudança, como eles estão querendo introduzir, não tem credibilidade alguma. “Um governo que assume, de forma golpista, dentro de toda essa estrutura, os principais objetivos são de interesses privados de grandes empresários. Volta-se uma política neoliberal, de terceirização do país, que se tem uma redução de gastos implementada através de lei. Em contradição, implanta um novo modelo, uma nova estrutura de ensino médio, onde teria que ter ampliação desses custos, então já é possível perceber oque de fato irá acontecer”.

A educação, sem dúvidas, é a área que mais necessita de investimentos e de atenção por parte do governo. Segundo o próprio presidente Temer, a educação é à base do desenvolvimento do país. “Educação é a porta de entrada para a cidadania. Investir na educação é investir na maior riqueza de um país, que é o seu povo. É construir um Brasil com mais oportunidades e mais justo”, afirmou Michel. Porém, a PEC 55 é uma redução de recursos nas áreas sociais. “Mas como reduzir esses recursos na prática? Ora, reduzindo o acesso a educação. Como se reduz os recursos das universidades públicas? Garantindo que menos estudantes consigam ingressar na universidade. E como se reduz? Com essa nova medida de reforma do ensino”, avalia a professora Enivalda Leite.

Outra maneira de reduzir esses gastos é através de medidas como a contratação de profissionais que detêm notório saber sobre determinados assuntos, a não obrigatoriedade de determinadas disciplinas e a opção da formação técnica. A professora de Matemática da rede estadual de ensino Eliane Peixoto, 29 anos, relata que a proposta é absurda e está totalmente atrelada à PEC que congela os gastos. “A princípio a redução de gastos se dá pela diminuição de disciplinas obrigatórias ofertadas, além da contratação de mão de obra mais barata, visto que poderão ser contratados profissionais que tiveram custo muito menor em sua formação. E em médio prazo, menos investimento na educação superior, pois a reforma enfatiza o ensino técnico profissional”. 

Ensino em tempo integral

De acordo com o Ministério da Educação, no Brasil, atualmente, há 386 mil alunos matriculados no ensino médio em tempo integral, o que representa 5% do total de alunos matriculados no ensino médio da rede de ensino brasileira. Entre as medidas que a reforma propõe está o ensino médio em tempo integral.Há muito tempo as esferas ligadas à educação têm lutado para conseguir melhorias no ensino, dentro de um debate, de um planejamento, de ampliação de recursos e de, principalmente, garantia de escola para os que não têm condições sociais. 

Não é possível inserir dentro desse modelo, é necessário que haja toda uma reestruturação. Porém, a reforma traz a proposta de aumento gradual da carga horária mínima anual, que sairia das 800 horas para 1,4 mil horas. É de grande relevância que o governo debata essa questão com todas as esferas da sociedade, mas não é o que acontece.

“Onde os estudantes que não podem ingressar no ensino integral irão estudar? Por exemplo, os milhões de estudantes brasileiros que trabalham e serão impossibilitados de ingressar em uma escola de tempo integral, onde eles irão concluir seus estudos? Aqueles milhões de estudantes que precisam fazer tarefas de meio período, seja ajudando na família, mesmo em uma atividade de comercio, como eles serão contemplados e como terão sua vida organizada? questionou Enivalda. “É outro aspecto que o governo não explica e não explica porque não tem resposta, não tem explicação.As escolas precisam de uma reforma, mas não é essa a reforma”, acrescentou a professora.

Os índices de educação pública no Brasil, segundo o IDEB, Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, são baixos.“Há um conjunto de fatores.Faz-se necessário uma mudança muito radical para que esses índices venham aumentar. Não adianta índice por índice, a gente tem que se preocupar com qualidade, e para isso exige toda uma logística para que os governos municipais, estaduais, as escolas particulares se enquadrem nessa nova realidade. Há toda uma problemática por trás disso’, concluiu Jaílton, coordenador do colégio particular Dom Bosco. 

Ex-aluno do colégio Nestor Carvalho diz 
acreditar nos benefícios da reforma
Por outro lado, acredita-se nos benefícios que a reforma pode trazer para o Brasil, principalmente o aumento da carga horária. Como Rony Clayton Lima, 18 anos, que terminou o ensino médio há um ano na Escola Estadual Professor Nestor Carvalho Lima, em Itabaiana, e está na tentativa de ingressar no ensino superior. Ele acredita que o ensino em tempo integral contribua de forma direta para elevar os índices educacionais, o que implica na redução da marginalidade: “se o aluno está na escola, produzindo conhecimento, ele não estará nas ruas”, confessou o rapaz.

Mas a estudante do 3° ano do ensino médio Stefanny Souza, 18 anos, se contrapõe a essa ideia. “Seria melhor que ele investisse na boa educação, do que apenas aumentar a carga horária, investir nos professores, ao invés do tempo. Sempre achei que o problema da marginalização e do trabalho infantil fosse a falta de oportunidade, e se o governo retira de determinado local o acesso à educação, aquele jovem, provavelmente, vai atrás de outros recursos, seja no trabalho ou em outras maneiras”. 


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