1 de jun. de 2017

A solução que traz novos problemas


Por: Victoria Costa

Um dos assuntos mais repercutidos nos últimos meses, o Novo Ensino Médio teve sua medida provisória transforma em lei, sancionada no dia 16 de fevereiro pelo Presidente Michel Temer. Sua aprovação na Câmara dos Deputados ocorreu no dia 13 de dezembro do ano passado. Já a aprovação por parte do Senado ocorreu em 08 de fevereiro deste ano, na qual foram obtidos 43 votos a favor e 13 contra o Projeto de Lei. Desde então a proposta tornou-se uma pauta pertinente no país e vem sendo discutida amplamente nos mais diversos âmbitos. Entretanto ela tem gerado intensos debates, especialmente, entre os estudantes e profissionais de educação – justamente por se tratar dos maiores envolvidos nessa reforma.

Entre as mudanças previstas pela nova lei estão à implantação de escolas de Ensino Médio em tempo integral, com sete horas de aula em 200 dias letivos; ampliação da carga horária mínima anual do ensino médio de 800 para 1.400 horas; a determinação que o ensino de língua portuguesa e matemática serão obrigatórios nos três anos do ensino médio; a autorização para que profissionais com "notório saber", reconhecido pelo sistema de ensino, possam dar aulas exclusivamente para cursos de formação técnica, desde que ligadas às áreas de atuação deles; e currículo composto pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC) no qual será definido cada sistema de ensino com ênfase em determinadas áreas de conhecimento– podendo ser de linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas e formação técnica e profissional.

Todas as alterações que estão previstas na proposta do novo ensino médio estão gerando opiniões bastante adversas. Enquanto para alguns mudanças são sempre bem vindas independente de suas motivações, para outros houve uma ausência de diálogo, visto que o projeto foi proposto sem um consenso que o antecedesse, e sem maiores opiniões dos educadores e dos estudantes.

Execução da proposta

Muitos profissionais de educação estão em desacordo com a execução da proposta, o que é o caso de Aldirene dos Santos, professora de Química do Colégio 24 de Outubro, localizado no bairro 18 do Forte, que afirma “Eu não concordo com a proposta do novo ensino médio da divisão por áreas, porque a gente lutou tanto para que se tivesse um ensino que abordasse tudo;  para que os alunos tivessem um conhecimento não-especifico; que tivesse um conhecimento geral global sobre tudo, então agora voltaremos a estaca zero com tudo compartimentado de novo.”. Ela ainda ressalta “Essa reforma é uma farsa, nós professores não fomos consultados, os alunos se manifestaram contra, outra coisa que a gente tem que observar é que toda vez que ocorrem essas mudanças as escolas particulares não são obrigadas a adotar essas medidas, e é o que vai acontecer agora. Eu duvido que alguma escola particular aceite essas mudanças.”
A coordenadora do Colégio Estadual Professor
 Joaquim Sobral se inclina a favor da reforma.

Já a coordenadora do Colégio Estadual Professor Joaquim Vieira Sobral, localizado no conjunto Santa Lúcia, Karen Virgínio, acredita que é necessário que ocorram mudanças “Eu acho que toda mudança é válida, porque do jeito que está não pode continuar. Se a gente acredita que do jeito que a organização curricular está elaborada não está dando certo, tem que haver uma mudança, porque a gente não sabe ver se vai dar certo ou vai dar errado. Eu acredito que tem que acontecer essa mudança e torço para que dê certo.”

A coordenadora do Colégio Estadual 24 de Outubro e professora de Português, Kleise Gaudino, tem um pensamento semelhante ao anterior “A intenção e a busca é por inovação, porém se irá melhorar vai depender das instituições e dos gestores. Pois a inovação não é uma questão, já que nós gestores estamos sempre inovando. O problema é a forma como será executado, porque a lei dará liberdade para a execução, apesar dessa discussão grande sobre a questão do aluno escolher entre as áreas de conhecimento. Porém tudo depende de como isso vai ser gerido na escola. Depende de como o ensino fundamental irá levar o menino para o ensino médio, se ele realmente irá entrar no ensino médio com essa capacidade de escolha e se o gestor vai dar essas possibilidades de escolhas.”

Áreas de conhecimento e a maturidade dos alunos

Uma questão pertinente relacionada à reforma é o questionamento sobre se alunos, que em sua maioria são adolescentes, terão maturidade emocional para escolher tão cedo qual área de conhecimento – e atuação no futuro – tendo em vista que essa é uma das propostas mais repercutidas.

Kleise Gaudino, porém, acredita que a maturidade pode ser trabalhada desde cedo nos jovens “Ter a liberdade de optar não é ruim, a questão é se o aluno está preparado para optar. Eu acho que vai caber ao gestor e aos formadores de ensino fundamental ainda essa fomentação, para saber se o aluno já está preparado para entrar nesse momento de escolha. Nós sabemos que em outros países do mundo essa escolha é feita e o aluno conseguiu se adaptar a isso. Agora aqui no Brasil vai ocorrer um momento para essa experiência.” Para ela é determinante que o aluno esteja preparado pela escola e pela sua família para estar cada dia mais cedo preparado para realizar essa escolha. Já que no mundo em geral as pessoas fazem bem cedo sua escolha.

Karen Virgínio compartilha de uma opinião parecida “Eu acho que tudo depende da educação e da forma que eles vivem dentro de casa. Existem algumas crianças que são precoces, que com 15 anos podem  já estar decididas, ou pelo menos tem um encaminhamento, já querem seguir determinadas profissões. Tudo depende de conversas e da cabeça da pessoa. Às vezes tem uma criança de 15 que tem a cabeça “lá na frente”, então para essas pessoas está ótimo. Isso então é uma questão muito particular.  Mas eu acredito sim que uma pessoa de 15/16 anos já tenha pelo menos uma direção. Pode até não saber o que quer, mas já tem uma noção se é de humanas ou exatas. E existem também os exames psicológicos que ajudam á saber qual a área e podem ajudar também.”
No colégio Purificação predominam as posições contrárias

Sob outra perspectiva, o diretor do colégio Purificação, José Joaquim Macedo, por exemplo, é contra essa medida e afirma “ Existe um grande índice no número de alunos que entram no curso e mudam. Eu soube de pesquisas que chegam a grandes números, o índice de alunos que mudam de curso entre o primeiro e o segundo ano. Essa idade é muito nova para você definir. Eu me questiono: quando esse jovem se arrepender como vai ser? porque falta maturidade para eles, e maturidade é uma coisa muito importante, essa escolha será precoce.  A Precocidade sempre prejudica, eu nunca vi nada precoce que não chega lá frente e encontra um prejuízo. Isso é uma espécie de queima etapas.”

O professor de Língua Portuguesa e Literatura, Dickson Soares, também do colégio Purificação, desacredita que os alunos já possuam discernimento para realizar tal escolha “Alguns pontos sobre essa reforma são discutíveis, mas em geral minha visão é que existe um adiantamento, é uma escolha precoce, como se o governo jogasse toda a responsabilidade da escolha para um aluno de ainda 15 anos, e hoje na conotação que a gente tem o aluno chega às vezes no 3° ano e não sabe qual rumo seguir, muitas vezes ele entra numa faculdade e desiste e vai para outra. Então de certa forma é como se fosse uma isenção do estado.” O professor ainda é bastante enfático nas críticas ao governo “O governo vem com uma ideia velada de escolha, e seria uma escolha precoce, porque são poucos os alunos dessa idade que possuem maturidade suficiente para escolher. Mas eles embasam a proposta na ideia de que é legal você escolher o que você quer estudar, é isso o que mais passa nas propagandas.”

Já na visão dos alunos as propostas da medida também geram divergentes opiniões. Para Stefany Alves, 16 anos, estudante do colégio 24 de Outubro, por exemplo, “Eu acho que nós que estamos no ensino médio já entendemos o que nós queremos para o futuro, por isso por mais que tenha uma dúvida acho que todos temos uma noção do que queremos. Então para mim seria muito melhor estudar só aquilo que eu vou precisar na minha faculdade ou trabalho, do que perder tempo estudando coisas que eu nunca mais irei estudar depois da escola.”

Em contrapartida a isso, Nathalia Ribeiro, 14, aluna do 1° ano do colégio San Rafael discorda dessa proposta e afirma “Se eu tivesse que escolher já ano que vem o que eu quero eu acho que ainda não saberia, porque eu acho que sou muito nova ainda para ter que escolher uma coisa que eu só vou saber quando eu tiver que entrar na faculdade. E acho que talvez até depois da faculdade eu não sei se já vou ter certeza de qual área quero para mim.” 

Matérias optativas e flexibilidade curricular

André Santos, 18, aluno do 3° ano do colégio Colégio Estadual Prof. Joaquim Vieira Sobral, por exemplo, não é favorável a não obrigatoriedade dessas disciplinas “Pelo que eu percebo dos meus colegas, infelizmente os alunos vão preferir não estudar essas matérias, já que eles não serão obrigados. O que será muito triste porque as matérias de sociologia e filosofia são muito importantes, por nos ajudarem a pensar; e educação física é muito importante também, pois muitos jovens são sedentários e não gostam de praticar esportes.”. 

Para Luan Vasconcelos, 17, que acabou de concluir o ensino médio no Colégio Purificação a flexibilidade pode ser prejudicial por gerar disparidade numérica entre as áreas escolhidas “Eu acho bem provável que muitos estudantes escolham uma área por influência dos amigos ou por acharem que é mais fácil, e acredito que possa acabar acontecendo de uma área ter muitos alunos matriculados, enquanto a outra tenha poucos, ou nenhum.”

Portanto pode-se perceber o quanto essa lei vem gerando cada vez mais diversas opiniões, que são discordantes entre os participantes do ensino médio – sejam eles alunos, professores ou gestores – e a tendência é que essas discussões se intensifiquem conforme as pessoas possuam mais conhecimento sobre a MP, e principalmente enquanto as propostas continuem sendo massivamente divulgadas pelo governo.

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