1 de jun. de 2017

Quem ganha, quem perde com as mudanças

Por Larissa Valença

A série de medidas que reformularão o modelo de ensino atual já foi aprovada e entrará em vigor quando a Base Nacional Curricular Comum (BNCC) for definida. Contudo, mesmo com o fato de as mudanças já estarem em andamento  não quer dizer que foram aceitas integral e massivamente.

O movimento que luta contra a correnteza é enorme, basta falar com os diretamente afetados, professores e alunos, para percebê-lo. Inclusive, dos 78.076 votos  computados na página do Senado Federal, 4.551 foram a favor e 73.565 contra a Medida Provisória. E é desse cenário conflitante que nos falam as diversas fontes entrevistadas no município de Aracaju. A falta de diálogo com a sociedade é uma das principais queixas da categoria  docente e envolvidos na educação. 

“É uma coisa que já veio imposta. A gente soube através das propagandas que apareceram na televisão, que já estava certa, que já estava pronta. Não há discussão com o docente. Colocaram para discutirmos uma Base Nacional Curricular Comum, a BNCC, que essa sim ainda está em andamento. No entanto, por trás, estavam fazendo essa Reforma no Ensino Médio. Quer dizer, o que diz que é mais urgente, que é discutir  com os profissionais da área, não foi discutido. E de repente: Reforma do Ensino Médio. Eu confesso que me assustei quando eu vi porque eu soube pela televisão, aí tive que ir atrás para me informar”, diz Danielle Barboza, professora de Português do Colégio Estadual Joaquim Vieira Sobral, localizado no Bairro Jabutiana, zona Sul de Aracaju, sobre como ficou a par da reforma. A professora concorda que toda a educação precisa de reforma, porém não com ênfase nesses pontos e nem dessa forma que foi conduzida. 

O professor de Filosofia do Nossa Escola Roger Soares compartilha da mesma experiência de Danielle, mas considera que houve sim debate. Quando lançada a proposta de construção da BNCC no Portal, desde julho de 2015 e aberta à contribuições do público, em setembro do mesmo ano. Em março de 2016, a consulta foi concluída, com mais de 12 milhões de contribuições. “Na minha visão, trata-se de um processo extremamente democrático que foi dificultado por conta de uma ideia de caráter emergencial da reforma. Uma medida emergencial que não se justifica em si mesma. O próprio Plano Nacional de Educação já tinha como objetivo determinar diretrizes, metas e estratégias para a política educacional dos próximos dez anos”, encerra Roger.


Direito à Educação

O PNE foi apresentado pela então presidenta Dilma Rousseff em 2010 e sancionado em 2014, após quatro anos de discussões, revisões e audiências públicas com participação  de atores governamentais, instituições de educação, representantes da comunidade educacional, entidades científicas, diversas redes de movimento como a ‘Campanha Nacional pelo Direito à Educação’ e ‘Todos pela Educação’, membros da sociedade civil e membros da sociedade civil vinculada ao setor privado na área educacional. Portanto, suficientemente debatida, ao contrário da MP, que infelizmente impediu estudantes de participarem da audiência pública (09.11.2016), só liberando a entrada após mais da metade de andamento da conferência e, mesmo assim, aos estudantes não foi dada a fala.

No site da União Nacional dos Estudantes (UNE) os estudantes do movimento se posicionaram sobre: “Após insistência, a presidenta da UNE foi liberada para participar da mesa. Na sua fala, ela apelou para uma reforma do Ensino Médio discutida com todos os setores da educação, incluindo alunos, e respondeu à ironia do presidente ilegítimo Michel Temer, que um dia antes havia declarado que os alunos que ocupam escolas não sabem o que é uma MP.”

Vale lembrar que o PNE é decenal, ou seja, ultrapassa governos. Além dele a Lei de Diretrizes e Bases (LDB), sancionada em 1996, também sofre afrontas. Sancionada pelo Ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, estabelecia o currículo obrigatório da educação básica e articulava o ensino médio à formação técnica e profissional. Ambos já estabeleciam diretrizes para a educação, logo, muitas das medidas da Medida Provisória já estavam previstas.

Mais um dos professores que conheceu a proposta de reforma pela televisão, Arivaldo Montalvão é professor de Sociologia do Colégio Estadual Governador João Alves Filho, localizado no bairro Salgado Filho, que inclusive aderiu ao tempo integral, e também cita a lei quando defende que não houve debate. “Quando a gente fala que não houve debate, é na forma da implementação do sistema dessa reforma. Se chamou algumas pessoas ligadas geralmente à grupos empresariais da educação para poder falar e debater sobre essa reforma, então, não foi discutido. Quando o governo diz: “ Ah, teve debate”, teve, porque se a gente retomar a LDB e o PNE, tudo isso está previsto. Agora, a forma como se faz, como é que isso vai se implementar é que não tem debate (...) Nós professores, que estamos na sala de aula realmente não somos escutados”, fala .

O professor cita ainda as outras decisões que atingem direta ou indiretamente o novo ensino médio. A PEC 246 ou do Teto dos gastos públicos foi promulgada no dia 13 de dezembro do ano passado e impõe limite dos gastos públicos, congelando os gastos em 20 anos, e alterando assim o financiamento da saúde e educação brasileira. “Para você fazer a reforma do ensino médio como eles querem, você precisa ampliar recursos.  Só que como é que você vai ampliar recursos se você tem uma PEC que congela  gastos ?”.

Professores descartáveis 

Outra mudança polêmica é a liberdade de contratação para profissionais com ‘notório saber’ para o ensino técnico e profissional ou trabalhadores graduados que tenham feito complementação pedagógica, segundo artigos IV e V do texto final da MP.

Como  esperado, a categoria docente não está nada satisfeita com a mudança. A professora do Colégio Estadual Joaquim Vieira Sobral Efigênia Barbosa, no bairro Jabutiana, questiona se o processo de ‘julgamento’ será efetivo “Quem avalia quem tem um notório saber tem um notório saber para dizer quem tem o notório saber?” - É curioso, no entanto, que a professora nomeia o novo requisito como “balela” mas, questionada sobre suas ocupações, se declara professora de História, Filosofia e Sociologia quando na realidade só tem plena licenciatura em História, de acordo com os Dados do Servidor disponível no site da Secretaria de Estado da educação de Sergipe (SEED) – “No Brasil você é advogado e assume a Secretaria da Saúde. Não que não tenha capacidade, mas, entre um médico e um advogado para assumir, em tese, o médico teria mais capacidade”. A professora se refere à José Almeida Lima, que é graduado em Direito pela UFS e já exerceu diversos cargos políticos. 

Amália Soares também é professora do Vieira Sobral, onde leciona Geografia e considera o “notório saber” como um retrocesso. “Justo agora quando o Brasil estava avançando, pela LDB, que hoje está vigente, tínhamos um prazo de 10 anos para que todos os professores em sala de aula tivessem licenciatura. Agora que estávamos conseguindo diminuir essa margem vem essa medida”, diz ela. Critica as propagandas que bombardeiam as televisões brasileiras taxando-as fantasiosas, para o puro convencimento dos alunos, e imediatistas, para que o aluno pense que as mudanças ocorrerão em um instante, em “um estalar de dedos”, como coloca a professora.  “É colocado que o aluno vai escolher o que ele quer estudar. Então, ele não gosta de Geografia, ele não vai querer estudar. Como se nós (professores) fôssemos descartáveis”, declara.

Exclusão de disciplinas, exclusão de direitos 

No texto original da MP, a alteração do inciso 1 do Ar t.26 dispõe que :” os currículos a que se refere o caput devem abranger, obrigatoriamente, o estudo da língua portuguesa e da matemática, o conhecimento do mundo físico e natural e da realidade social e política, especialmente da República Federativa do Brasil”. Ou seja, exceto Português, Matemática e Inglês (que será implantando desde o 6º ano do fundamental, segundo inciso 5 do mesmo artigo), as outras matérias seriam diluídas na Base Nacional Curricular Comum, não como disciplinas em si, mas conteúdos de uma área abrangente.
A exclusão das disciplinas gerou bastante revolta, professores, alunos e cidadãos resistiram às intenções da MP e, felizmente, surtiu certo efeito. No texto final, o encaminhado para sanção, finalmente são citadas as disciplinas descartadas. O Inciso 2 prevê que a BNCC  inclua obrigatoriamente ‘estudos e práticas’ de Educação Física, Arte, Filosofia e Sociologia no Ensino Médio.

 Danielle estranha essa decisão : “A gente acabou de colocar essas disciplinas. Tirou inclusive carga horária de português para colocar disciplina de Artes, Educação Física, a gente diminuiu carga horária de outras disciplinas”, afirma a professora de Português.

 Já para Paulo Lyra, de 18 anos, que terminou seu Ensino Médio no ano passado em escola particular, o que mudará é o foco do estudo, que será mais científico do que é hoje. Enxerga privilégios para o estudante do novo ensino: “acho muito interessante a ideia do aluno poder escolher a área em que estudará, acho fantástico, principalmente porque não é de imediato, mas depois de ter experiência”. Mas também vê prejuízos: “acho bom que houvesse possibilidade de escolher permanecer com o estudo ‘geral’ e a possibilidade das escolas ofertarem apenas algumas das áreas de estudo para os alunos eu não vejo com bons olhos, pois o aluno não terá verdadeira liberdade de escolha de seu estudo” . Conclui sua fala mostrando insatisfação tanto com o molde atual, que considera como exaustivo e ineficiente, quanto com o da reforma, que é incompleto. “Acho, na verdade, que seria melhor um terceiro molde”.


O coordenador do Colégio Jardins, no bairro Grageru, Demersom Moura, garante que  a escola está preparada para caso as mudanças realmente entre em voga. Contudo, não consegue enxergar na prática a Reforma: “ na escola particular temos condição, só não temos quem vai pagar porque o pai não vai querer assumir esse custo. O governo não vai querer arcar com o custo e tampouco o pai, que já faz muito pagando  escola particular para o filho, que é um direito nosso garantido na Constituição ter a educação de qualidade, que nós não temos.” diz o coordenador do Ensino Médio, e reafirma que os pais dos alunos se mostram bastante econômicos durante algumas reuniões em que foi discutido o tempo integral. “O problema não é ofertar o ensino integral, o problema é  você ter aluno em tempo integral. Você não pode pensar numa economia privada  e não trabalhar com números mínimos de alunos, tem que trabalhar com número que dê para pagar as suas despesas e ainda gere uma certa lucratividade. No caso do ensino integral no colégio particular depende muito da questão do aluno querer, do pai ter condições de  pagar”, explica o gestor.

Demersom questiona o que se fará com todo alunado que estuda em um turno. Afinal, com o tempo integral, não haverá mais divisão, como os alunos passariam a estudar em tempo integral se não há escolas o suficiente para absorver todo esse ‘excedente’?  
“O próprio governo está dando um tiro no pé porque ele não tem condições de ofertar o tempo integral, ele não consegue implantar nas escolas públicas, imagine com os particulares, que não vão conter esse prejuízo, não vão bancar esse custo por si só. Ao repassar para os aluno fica aquela questão : Quem aderirá a isso?”.
Por fim, critica a Reforma por considerá-la excludente: “ As escolas particulares terão condições, as públicas não. Será para poucos. Como o PRONATEC foi para poucos. E a maioria dos projetos  que se fazem na realidade não chega a atingir sua totalidade, acaba privilegiando  poucos, mas a sua grande maioria que é o público mais necessitado não chega a alcançar.”

Menos vagas nas Universidades, mais notório saber?

No dia 14 de outubro de 2016, foi publicada no Diário Oficial da União a Portaria nº 20, que trata diminuição de vagas em Universidades Federais e privadas. Antes, era necessário que as instituições seguissem uma série de procedimentos burocráticos, mas, com a alteração, ela ganham autonomia para a redução e só se faz obrigatório informar à Secretaria de Regulação e Supervisão do Ensino Superior (SERES), porém, para ampliar o número disponível todo o processo de documentos ainda se faz preciso. 

Tal medida parece estratégica quando promulgada após submissão da MP. Retirar recursos das Universidades para aplicá-los ao novo ensino médio sem necessidade de desembolsar mais dinheiro, agindo de acordo com a PEC do teto. Para Arivaldo, os recursos para o ensino em tempo integral seriam retirados das faculdades, dos cortes do Ciência sem Fronteiras.

“É um outro equívoco. Sem Universidade forte, não existe ensino médio forte. Onde é que se produz conhecimento?  Na Universidade. Se a  Universidade  não tem recursos,  não consegue funcionar, onde é que se forma professor?”. E relembra a defesa da junção do Ministério da Ciência e Tecnologia ao Ensino Superior:  Sem faculdade não existe Ensino Médio. Tanto é que no início do Governo Lula, quando Cristovam Buarque foi Ministro da educação, ele queria tirar as Universidades do MEC e passar para o Ministério da Ciência e Tecnologia. A base tem de estar forte, só que a gente imagina a base não como a Universidade, mas ela também faz parte da base, porque é lá que vai se formar o professor”.

Comenta ainda sobre a formação superior: “E ainda, com a inclusão do ‘notório saber’, qual será o estímulo às licenciaturas ofertadas? Eles dizem que o notório saber não é para o ensino médio, só para o profissionalizante, espero que realmente seja. O que já é complicado. A gente sabe que nossas licenciaturas já não são valorizadas na própria faculdade, então já cria um problema a partir daí”, questiona o professor.

Falta estrutura

Com a ampliação da carga horária do alunos, o ensino passará a ser em tempo integral, de 5 horas diárias para no mínimo 7. O aluno do ensino público passará a além de tomar o café da manhã na escola, almoçar, tomar banho, trocar de roupa, enfim faz- se necessária uma série de estruturas para suprir qualitativamente as demandas que se farão gritantes com o ensino em tempo integral. Sem contar que precisa-se de laboratórios, infraestrutura específica para o ensino técnico e seus respectivos instrumentos. 

Efigênia Barbosa, professora de História da Colégio  Estadual Joaquim Vieira Sobral, no Jabutiana, considera a integralidade  possível, porém, alega que as escolas não são preparadas para isso. Refeitório, vestiário, alimentação, essas são algumas coisas que cita como imprescindíveis na infraestrutura e que deixa claro não existir no colégios. “Não tem nem banheiro decente para meio turno, você imagine (se fosse integral). Como é que você quer que o aluno fique o dia todo para aprender, porque a intenção é aprender, né? No calor, porque as escolas não têm ar condicionado, e quando têm ventilador , assim que coloca, quebra, ou os mesmos alunos levam, às vezes.” 

Danielly Cardoso é estudante do 1º ano do ensino médio no Colégio Estadual Dom Luciano, no bairro São José, e fala com conhecimento de causa sobre a falta de recursos da escola: “O meu colégio já tem quadra, só teria de ser melhorada, mesmo assim, o tempo para reforma excederia o que o MEC propôs. Também temos refeitório, mas não disponibilidade de comida. É só o espaço, praticamente. A gente só come broa, às vezes arroz doce ou cachorro quente. No momento em que teve a greve, que a gente ocupou o colégio, a gente fazia comida lá, os próprios alunos faziam comida. Então, tem como variar comidas, mas não é o que acontece, porque a gente já viu muita comida entrando e ficando por lá. Já vimos entrar suco de caixinha, mas é muito raro consumirmos”.

 Ela fala ainda sobre o quanto as reformas para adequar o colégio atrasaria o ano letivo: “Demoraria muito tempo para providenciar isso e já estamos muito atrasados, provavelmente terá greve novamente”. A estudante se refere ao período em que as ocupações somadas às greves em protesto à PEC 55, à submissão da MP e contra às irregularidades na escola, além de outros problemas  que os alunos enfrentam com os professores, cita uma professora que falta bastante, “ o nosso professor de Sociologia só veio aparecer  no meio do ano, a gente ficou muito atrasado e ele também não faz muita coisa”

A SEED respondeu à reivindicação dos alunos em nota enviada ao Portal Infonet, esclarecendo que as escolas que adotarem o modelo de ensino integral receberão investimentos para  infraestrutura. Afirmam que o valor de R$ 457 milhões de reais nos próximos 10 anos será repassado às escolas que aderirem.  

O professor Arivaldo comenta sobre o investimento: “Você pode ver a nossa sala (e  aponta a sala de aula em que foi concedida a entrevista. Nela não há ventiladores, há muitas cadeiras e inclusive algumas em desuso no canto da sala), como é, nesse calor. Aí você imagine um menino ficar aqui das 7 da manhã até às 16 e 30 da tarde. Numa escola quente, numa escola que não tem estrutura para receber ele, ele não pode nem tomar um banho porque não tem vestiário. O próprio secretário da educação daqui do estado diz que essas reformas foram acertadas com o MEC, que serão feitas durantes três anos, para preparar toda a estrutura de escola”.

E traz ainda um questionamento mais que pertinente: “Só que quando será feito isso ? Em período de aula ? Vai suspender as aulas para fazer a reforma ? A gente não sabe o que é que vai acontecer, tem lá dizendo, mas a gente não sabe se vai acontecer na prática.”

Para convencer é só repetir

Desde que foi lançada a MP, em 2016, as mídias brasileiras são preenchidas de propagandas do novo ensino médio. Liberadas em horários estratégicos e repetidas quase serialmente, mostram pessoas bonitas, salas novinhas em folha e sorrisos de satisfação. Em uma delas um jovem levanta-se de sua cadeira e vai à frente da sala  explicar aos seus colegas, o que é o novo ensino. “Sabia que ela foi baseada nas experiências de diversos países? Países que tratam a educação como prioridade. E que ela vai deixar o aprendizado muito mais estimulante e compatível com os jovens de hoje?”, ele diz, enquanto na lousa são listados os supostos países que serviram como modelo, dentre eles: Coreia do Sul, Inglaterra, Portugal, França e Austrália. 

“País desenvolvido é uma coisa, Brasil é outra. No país desenvolvido, eles estão fechando as prisões. Aqui ‘tá’ soltando os presos porque não cabe mais”. Ela frisa a realidade do país, argumentando que não se pode comparar a nossa com outras que divergem tanto. Há, no mínimo cinco presídios em toda Sergipe ( ados de 2008 do  Departamento Penitenciário nacional) e apenas uma universidade, a Federal de Sergipe, que tem apenas polos em outros municípios. “Um país que constrói mais presídio do que universidades públicas tem algo de errado”, completa a professora de História Efigênia.

Danielly, estudante do ensino médio, conta que representantes da Secretaria da Educação foram à escola para apresentar o plano de mudanças aos alunos e inclusive deram testemunhos de sucesso em experiências que tiveram: “As duas que falaram mais, disseram ser professoras de Colégios Estaduais, que vieram da mesma faculdade, que fizeram juntas. Elas disseram que já tinham dado aula e que tinham sido alunas nesse tipo de colégio (integral). Disseram que tinham certas dificuldades, como a que nós citamos, porque teve bastante discussão com os alunos. Elas confessaram que foi difícil para elas mas garantiram que não seria mais assim pelo fato do dinheiro que vai ser repassado todo ano para o colégio”, para ela, foi uma tentativa de convencer, não de esclarecer, pois considera que foram exaltados apenas pontos positivos. 

A aluna ainda esclarece a causa da visita falando do  problema com a procuradora do alunado: “A representante dos alunos já teve contato com esse assunto antes da gente e não nos comunicou. Ela disse sim para uma coisa que a gente nem sabia como seria”.  Logo no início de 2017, em reunião com o Conselho Escolar, o Secretário da Educação Jorge Carvalho saiu com documentos em mãos que tratavam da aprovação do Dom Luciano quanto ao ensino em tempo integral, sendo que não houve consentimento da comunidade escolar, e no dia 10 de fevereiro, no Diário Oficial da SEED, sai o edital da seleção de professores para ensinar no novo modelo, constando o Dom Luciano como uma das escolas com vagas disponíveis. 

A suposta adesão causou revolta não só aos professores e alunos como também mães, pais e funcionários, que juntos elaboraram um abaixo assinado para deixar clara a sua recusa à implantação da integralidade.



Daí surgiu a visita das representantes, após a recusa e reprovação dos atos da gerência do Colégio. Um dia depois, os professores reuniram os alunos no auditório para uma outra votação, agora com os estudantes esclarecidos. “Muita gente estava ali para dizer não”, afirma Danielly. Naquela mesma tarde de segunda (13.02), os estudantes protestaram em frente à escola e no auditório. E no dia 15, foram em frente à SEED para dizer não ao modelo. Alunos do turno da manhã e tarde se uniram e lotaram 5 ônibus , todos pagos pelos professores. “Ficamos por pouco tempo (cerca de 2 horas), mas acredito que pelo fato de ter muitos alunos, chamou um pouco a atenção”, conclui a aluna.

Neste ano, o governo investiu no Youtube para convencer os alunos. Foram desembolsados R$ 65. 000 para cada canal contratado: Você Sabia?, Pyong Lee, Rato Borrachudo, Rafael Moreira, Malena e T3ddy. Todos possuem público jovem, que provavelmente está ou estará no Ensino Médio. O vídeo causou uma enorme repercussão, os inscritos do Você Sabia? reclamaram que o conteúdo não estava com a tarja que avisa o informe publicitário. Após as reclamações, os proprietários do canal incluíram no vídeo o aviso de publicidade. Desde outubro, até janeiro deste ano o MEC gastou R$ 13 milhões em publicidade, segundo apuração da Folha de São Paulo. Um tanto curioso: informação ou propaganda? 

 “Pobre é para trabalhar”

Em 2015 foi publicado o estudo ‘Juventudes na escola, sentidos e buscas: Por que frequentam?’, de autoria dos sociólogos Miriam Abramovay, Mary Garcia Castro, Júlio Jacobo Waiselfisz com apoio do MEC, FLACSO- Brasil (Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais) e OEI (Organização dos Estados Ibero-americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura). A pesquisa ouviu mais de 8 mil estudantes dos 15 aos 29 nove anos. Os resultados mostram que 58,8% dos estudantes brasileiros de ensino médio trabalham e estudam simultaneamente e apontam os principais motivos para o abandono (a tal da evasão escolar  utilizada como argumento pelo presidente Temer) sendo eles: a necessidade de trabalhar (28%), a família (20,6%) e a gravidez (11,1%).

Fica claro então, que temos aqui um impasse. O que fariam esses quase 60% de jovens que trabalham? Certamente os estudantes de escola pública não abrirão mão do trabalho, vivemos em uma realidade na qual o jovem realmente precisa trabalhar para complementar a renda de casa. Dinheiro mata fome, estudo não. Apesar de investimento a longo prazo,  a estudo fica menor quando há urgência de sobreviver.   

Amália, a professora de Geografia do Colégio Estadual Joaquim Vieira Sobral, no Jabutiana, crê que as medidas só se justificariam pela demanda econômica. “Se for mão de obra para o mercado de trabalho, aí se justifica, entre aspas, porque você vai botar uma massa para ser técnica. E a gente sabe que o alunado quando começa a trabalhar, e ele tem um curso técnico, dificilmente ele chega no ensino superior depois. Principalmente quem vem de camadas da sociedade menos favorecida.”

Rosane Delfina, professora de  Educação Física do Vieira Sobral, completa a fala: “Aí você coloca o ensino técnico para quê? Porque pobre é para trabalhar, é só para formar mão de obra para o mercado de trabalho, por isso está começando pelo ensino médio”.

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