1 de jun. de 2017

Promessa de investimentos x redução dos gastos públicos

Por Fernanda dos Santos 

      Uma das primeiras contradições da lei do "Novo Ensino Médio" é com a redução de gastos na área da educação imposta pela PEC 241, embora, o governo diga que investirá cerca de 1,5 bilhões com essa reformulação, em dois anos, com a expectativa de que 500 milhões de jovens estejam em escolas de tempo integral até 2019.

      Especializado em gestão de organização escolar, Yure Norberto faz uma análise da situação e explica que, superficialmente, soa como contraditório, mas o real debate que deve se fazer é sobra a forma como o Ministério da Educação trabalha. É importante observar o que está por trás da aprovação de uma a PEC 241 que limita gastos para a educação e também a MP que mobiliza o aumento destes.

       O especialista explica que “o dinheiro  especificamente para uma política pública é limitado, por isso, precisa-se discutir quais medidas merecem prioridade e um investimento maior”. Segundo ele, “quando se fala de educação, quanto mais recursos, melhores serão os resultados. Mas o plano é finito, pois o estado não tem condições de financiar vários processos por inteiro, o tempo todo, é necessário fazer escolhas. Por causa de toda essa contradição teremos que abrir mão de algumas coisas para poder investir em outras.” O gestor indaga: “Quantas bolsas de FIES conseguem ser financiadas como este valor? E quantas escolas em tempo integral podem ser construídas? Então se o dinheiro está curto, qual a prioridade?”.

O poder da escolha

Colégio Estadual Dom Luciano José Cabral Duarte

“Os jovens poderão escolher o currículo mais adaptado às suas vocações”, prega o MEC, alegando que a reforma vai permitir que estudantes e escolas do ensino médio possam aprofundar seus conhecimentos adaptando o currículo às habilidades do aluno. Mas para o professor Fabiano Oliveira, essa proposta não é real, embora fosse ideal. Ele leciona Língua Portuguesa na escola estadual Dom Luciano, em Aracaju, e avalia que, culturalmente, não estamos preparados para isso.

“O formato é legal, entretanto, não é um hábito nosso é mais americano do que brasileiro. Além disso, nossa educação está no século XX e tem modelos jesuíticos (uma cadeira após a outra), sendo que estamos no século XXI. Por mais modernos que estejamos, ainda estamos presos às tradições. Assim, antes de ver se isso é bom ou ruim temos que observar a situação presente, que não está boa. Temos duas opções, continuar ou tentar mudar algo” – propõe Oliveira.


Centro de Excelência Atheneu Sergipense  

Wilemberguer Rodrigues, licenciado em História e professor do Centro de Excelência Atheneu Sergipense, em Aracaju, concorda que essa é mais uma das diversas controvérsias sobre a reforma. Ele não acredita nessa ideia de que aluno tenha capacidade de escolha. “Ainda estamos engatinhando e não temos continuidade de projetos espelhados em países desenvolvidos que certamente souberam esperar as propostas terem resultados.”



Escola Novos Rumos, em Nossa Srª do Socorro 
"Todo conhecimento que é dado hoje é utilizado na vida do aluno e o Enem prova isso", afirma Michel Souza, coordenador pedagógico do ensino médio da escola privada Novos Rumos, na cidade de Nossa Senhora do Socorro.

      De acordo com a medida provisória a ampliação do ensino médio para quatro anos foi pensada com intuito de beneficiar o jovem brasileiro, que termina muito cedo os estudos. De acordo com a MP, o estudante pode escolher mudar de diretriz e estender mais um ano.

      Caio Gabriel Alexandre Evangelista,18 anos, aluno do 3º ano do ensino médio na escola estadual Dom Luciano, acredita que a possibilidade de escolha é um ponto positivo da reforma. Isso porque, para ele, muita das vezes o aluno acredita ser desnecessário estudar matérias pelas quais não tem relevância no futuro profissional.

Propaganda enganosa?

     “Esse discurso positivo só pode ser feito por quem está no poder, nós que estamos abaixo recebemos a propaganda. Agora cabe a sociedade a reflexão. Caso o aluno tenha a capacidade de criticar o projeto e formar sua opinião, não tem propaganda que mude. Antes de falar que é bom ou ruim, devemos observar os pontos positivos e negativos e compará-los com a situação presente da educação brasileira, aconselha Oliveira.

      Para o professor Willembuguer Rodrigues, “aquilo que é bom não precisa de propaganda, mas aquilo que é duvidoso imperativo, autoritário, impositivo como a medida provisória é preciso legitimar por meio dela. Como dizia Joseph Goebbels, chefe da assessoria nazista, ‘uma mentira dita mil vezes se tornaria uma verdade’”.

     Yuri Norberto Pereira, questiona qual é o custo que estamos pagando para publicitar o novo ensino médio. O interessante é dialogar com as escolas e a sociedade. Além do mais, a Secretaria da Educação tem uma rede capaz de chegar as escolas de forma eficiente temos os conselhos de classe, estadual e instituições comunitárias.

Mais tempo na escola

      A nova lei do ensino médio prevê a ampliação da carga horária de 800 para 1.400 horas anuais, de forma gradativa. Todavia, ainda há questionamentos em relação ao horário do aluno no colégio. Wilemberguer Rodrigues, professor de História, conta que costuma dizer que “a escola é tudo hoje, menos escola, é creche”. Para ele, a saída não é aumentar a quantidade de dias letivos e carga horária pensando que a sala de aula é que vai transformar esse aluno: “pelo contrário, pode ser um tiro no pé”, alerta.

      Ex-estudante do ensino médio integral do Atheneu Sergipense, Natalia Souza, hoje discente de Economia na UFS, fala que de início não gostava muito da ideia de passar o dia todo no colégio. “Achei que iria tomar o meu tempo mas, pelo contrário, os instantes que eu passei no centro integral serviram como incentivo para eu estudar. O aluno tem que se transformar cada vez mais em estudante e não ser mais um matriculado no colégio. Afinal, é a educação que leva a gente para qualquer lugar”, afirma ela.

    José Sebastião dos Santos Filho, integrante da diretoria da Federação Nacional de Estabelecimentos Particulares de Ensino (Confenem), aponta uma contradição importante entre o parecer do Senador Pedro Chaves, Relator Mista que a medida provisória 746/ 2016, que deu origem à reforma, e o projeto de lei que a consolidou. O Senador diz à página 13 do seu relatório que:

"(...) 60% da carga horária do ensino médio deverão ser destinados à BNCC [Base Nacional Curricular Comum], a fim de garantir a unidade e a sincronia entre as escolas brasileiras. Optamos pelo percentual porque acreditamos que expressa um equilíbrio desejável que superará o valor de 1.200 horas previsto originalmente, que é insuficiente para propiciar que todos os estudantes acessem conteúdos relevantes para essa etapa da educação básica”.

Já a pagina 6, do 5º do art. 35-A do PLV 34/2016 afirma que: “ A carga horária destinada ao cumprimento da Base Nacional Comum Curricular não poderá ser superior a mil e oitocentas horas, do total da carga horária do ensino médio, de acordo com a definição do sistema de ensino”. Ou seja, enquanto o senador Pedro Chaves indicou que a BNCC deveria corresponder ao mínimo de 60% da carga horaria do ensino básico e fundamental, o texto da lei usou esse percentual como máximo.

Inviabilidade do curso noturno

Colégio Pio Décimo 
      Assessor da direção do colégio Pio X, em Aracaju, Sebastião Santos Filho acredita que de fato o aumento da carga, somente por horas, não leva a lugar nenhum. Ele afirma que o maior ponto negativo da ampliação é inviabilidade do ensino noturno. Por exemplo: “ se o jovem tiver que trabalhar para seu próprio sustento /ou para auxiliar em casa, ele provavelmente primeiro terá que completar 18 anos para ter acesso ao ensino de EJA (Educação de Jovens e Adultos), porque com a implantação o governo não esclarece como vamos dar aula em sete horas no período da noite”, cita Sebastião.

É importante observar que o aumento de carga horária da escola particular representa aumento de custos, que é repassado para a mensalidade escolar. “Esse é um dos maiores pontos discutidos pela Confenem, porque de certa forma esse novo ensino médio vai privilegiar poucos alunos da iniciativa privada, somente os que tem a possibilidade de pagar as mensalidades mais altas”, diz Sebastião.

      A estudante Gracekelly de Jesus, 16, do 2º ano do colégio particular Novos Rumos, demostra a dificuldade que irá passar com ampliação horária. “ Para mim não seria favorável, pois sou jovem aprendiz no turno da manhã”, afirma.
   
Ensino integral em Sergipe

      O governo de Sergipe vem ampliando o ensino médio em tempo integral nas escolas públicas desde 2009. Ao cumprir as legislações federais (PNE) e estadual (PEE) o objetivo é ampliar a oferta de vagas e atingir a meta de 50% até o ano de 2024. De acordo com a Secretaria da Educação de Sergipe, as escolas vão implementar o novo modelo de forma gradativa, referenciando-se a demanda da comunidade escolar e respeitando o estudo de impacto realizado com os alunos e professores. Os repasses de recursos do governo federal serão feitos ao longo de 10 anos e serão aplicadas na melhoria da estrutura e na modernização de laboratórios.

“ O ensino integral é interessante porque a gente tira os jovens das ruas”, opina a universitária Natalia Souza. “Mais a questão toda é como será essa forma de ensino, pensando como os educadores a gente acredita que os alunos se tornarão mais alienados do que hoje ”.

O especialista em gestão e organização escolar Yure Norberto Pereira avalia que o novo e o integral dialogam, mas que nem todas as escolas conseguirão atingir a meta de implantar o integral até 2024 e alcançar os 50% das matrículas previstos pela lei.

Flexibilização curricular
   
 Yure Pereira esclarece o funcionamento da flexibilização do currículo estudantil. “Durante um ano em meio o aluno vai ter como eixo as disciplinas estabelecidas pela Base Nacional Curricular, que deve se concretizar até a metade deste ano, ou seja, todas as matérias. Na metade do segundo ano e no terceiro entrará a figura da optativa. Isso pode assustar um pouco no início, mas é um debate que os próprios professores já fazem há algum tempo. E as optativas vão depender da área que o aluno deseja seguir.”  Por exemplo: “caso o estudante escolha a área de ciências biológicas irá pegar as matérias da área e as obrigatórias português, matemática, inglês; o resto ficará como optativa. Me parece interessante, mas, temos que ver isto na prática”, pondera.

A estudante de Economia da Universidade Federal de Sergipe (UFS) Natália Souza acredita que não haveria necessidade de tirar as disciplinas. “Nós temos experiências com centros de excelências públicos onde os alunos estudam em período integral, a grade curricular é normal à tarde farão aulas diferenciadas relacionadas ao esporte, arte, saúde e entre outras. ”

      “Conhecimento é base para ter êxito na vida” acredita Wilemberguer Rodrigues Oliveira. Mas para ele, o objetivo desse governo “é preparar os alunos para serem mão de obra a nível médio para o mercado, sem dar o direito a esses alunos de seguirem para o nível superior”. Com isso, a tendência é que haja uma diminuição de vagas nas universidades, acredita o professor de História.

A polêmica do "notório saber"
   
      “A MP [que virou lei] faz um ataque frontal à carreira docente, na medida em que admite que indivíduos ‘com notório saber’ possam dar aula, fica claro que não haverá investimento na formação de professores. Faltarão docentes e muitos deixarão de ser professores. ”afirma a presidente do Sindicato de Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo, Maria Isabel Noronha.

      Fabiano Oliveira compreende que a líder do sindicato tenta discutir sobre a falta valorização do professor, “é uma medida governamental e não estatal.  A questão de nós professores não ter sido chamados ou informados, à verdade é que não temos informações claras o gerou tal repercussão. Bom sabe-se tal fator na área técnica é permitido, com a seleção e graduados adequados a lei. ”

       Além disso, Yure Noberto diz “ fizeram muita zoada por pouca coisa”, porque já era possível fazer isso, nos termos da LDB. “O objetivo que propõe o notório saber é preencher essas brechas especificas. Isso não chegará nas escolas, nem de nível regular e na instituição técnica só chegará na medida excepcional. Mas concorda que faltou um pouco de comunicação.”

      José Sebastião Filho, assessor da Colégio Pio X fala, que é um ponto polêmico pois, ao entra na questão sindical “que obviamente quando se trata do sindicato ele somente aceita medidas que beneficiem a classe. ” Fato é que neste sentido o notório saber dever ser discutido em alguns pontos. Exemplo, a lei obriga que a partir do 6º ano do ensino fundamental somente os professores licenciados naquelas disciplinas possam leciona.

      “No ensino básico e regular talvez não tenha tanto problema pois você tem hoje cursos de licenciatura nas várias áreas. Apesar de que também existe um déficit de professores principalmente nas áreas de exatas.        Quando ela colocar que vai desvalorizar a carreira. No meu ponto de vista, o que “falta é uma política pública de incentivo a carreira do professor. ”

       “Se você fizer uma pesquisa no ensino médio, principalmente no terceiro ano do ensino médio e perguntar quantos deles querem ser professores, pouquíssimos vão responder que sim, isso parte de um governo que tem uma ação ausente na criação de políticas públicas que valorizem a carreira docente. O professor é base de todas as formações”.

CEED coloca os pingos nos is

      Em entrevista ao Contexto Repórter,  e a presidenta do Conselho Estadual de Educação de Sergipe, Luana Silva Boamorte de Matos, também integrante da Diretoria Regional de Educação do Alto Sertão (DRE), esclareceu as principais dúvidas com relação à implantação do novo ensino médio.
Conselho Estadual de Educação de Sergipe 

      “O novo ensino médio parte do pressuposto de ampliação de carga horária de 800 horas para 1.400 horas anuais. Então todas as escolas do sistema estadual que incorpora as escolas de rede privada e públicas farão parte do ensino médio. O novo ensino médio é para todo mundo e o integral é uma proposta que está previsto nos planos nacional e estadual de educação. Na meta 6 fala que 50% da oferta na escola pública tenha que ser em tempo integral e 25 % das matriculas sejam nessa modalidade. Diante disso, há fôlego maior para esta implantação do tempo integral” – completa Silva de Matos.

      Um ponto positivo a diretoria do CEES reconhece no novo ensino médio é fortalecimento do pacto federativo “porque as organizações curriculares e as organizações do novo ensino médio vão se processar nos conselhos estaduais”.
“Estamos aguardando a demanda. A gente vai esperar as escolas se organiza os prazos vão ser estabelecidas, então, as escolas se organizam por áreas e quais disciplinas vão ser ofertadas. Há uma parte diversificada que ficará a escolha da escola. E temos que esperar as organizações BNCC quanto a grade curricular.”

     Cada escola terá que enviar ao Conselho o currículo, como vai ficar organizado durante os três anos, para ser analisado e aprovado. Mas, de antemão, o ensino de matemática e português, inglês acontecerá durante os três anos, concentrando os componentes da BNCC. Esta é a questão que está mais forte no campo. “Em uma outra parte da carga horária entrarão os chamados itinerários informativos que seria linguagens códigos, ciências humanas e biológicas e uma quinta que vai ser um ensino profissionalizante, então a ideia dentro da secretaria de educação é que cada escola oferte dois itinerários informativos no mínimo. Enfim, ela tira a feição de disciplina, a base, e incluirá estudos e práticas.

A presidenta Luana Boamorte afirma a gente já trabalha com notório saber! “O objetivo não é tira o profissional docente da sala de aula para colocar qualquer pessoa que goste do tema para ministra aula não, os licenciados foi avanço de acordo com LDB; agora essa mudança permite que indivíduos com notório saber trabalhe no campo profissionalizante”, esclarece.

      É importante ter o básico uma parte vai ser destinado para isso e o outro quantitativo é de destaque para formação de professores. Inclusive, eles vão organizar de 29 a 31 uma formação de abordagem administrativa pedagógica. É uma nova escola que tentam implementar (a escola integral). Já o debate de avaliação é de cunho pedagógico é complicado porque vem de instituição de prova de não reconhecer o processo de aprendizagem do aluno em que ele precisa ser avaliado.

      Sobre o modo de discurso utilizado pelo governo, a presidenta da CEED diz que é uma ação de governo, está à frente acredita que é necessário. É utilizar o dinheiro para destinar a este fim para publizaisar a matéria e convencer a sociedade do projeto. “ É vender o peixe”.

     Já a prova que seleciona inúmeros jovens do ensino médio, o Enem vai continuar existindo é o que se deseja. Agora a mudança esta duração do exame (muito extenso) é que se fala do ministério. Agora estão negociando outras formas de exames para adentrar na Faculdade. O pré-vestibular continua. Ele possui uma rede muito forte, confirma Boamoerte.

      Luana Boamorte, presidenta do conselho diz que a reforma vem como nascimento para democratizar e
qualificar essa oferta. Se dará certo só o processo nos dirá, há muito a caminhar.

      O professor Fabiano Oliveira de Letras considera que essa reforma implica em preparação ao longo dos anos. “É uma coisa ampla, complexa, pois mexe com profissional, a família, a estrutura da escola, o corpo da sociedade. Então ela mexe com todo mundo. ”

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