27 de jan. de 2014

Lagarto possui dez cubanos do Programa Mais Médicos

 Município com maior número de médicos cubanos em Sergipe enfrenta problemas de estrutura em postos
                                                                                                    Por Marília Santos e Yago de Andrade

Seis meses após ser lançado, o Programa Mais Médicos do governo federal já conta com 6.658 médicos (88% estrangeiros e 12% brasileiros) e busca atingir 13 mil até março deste ano. Para a terceira etapa, a proposta inicial era de 6,3 mil médicos, porém, somente 888 foram habilitados, sendo 466 intercambistas e 422 brasileiros formados no país. Com isso o governo terá a opção de “importar” 5412 médicos cubanos para atingir as metas.

O Programa chegou aos municípios sergipanos em outubro passado e tem melhorado a vida da população carente de povoados que dependem do Sistema Único de Saúde (SUS). Porém, alguns municípios como Lagarto ainda tentam resolver problemas de estrutura em postos.

O município de Lagarto, na região centro-sul de Sergipe, 75 km da capital Aracaju, recebeu 10 médicos, todos cubanos, (seis no primeiro ciclo e quatro no segundo). Porém, mesmo com a vinda dos médicos, alguns postos continuam funcionando de maneira improvisada, como o situado no povoado Colônia Treze. Em um galpão com divisórias de madeira, pacientes sentados em macas e bancos sem conforto, lixo em contato com o ambiente da recepção e falta de ventilação nos consultórios denunciam os problemas estruturais, que não têm previsão para serem solucionados.

A médica cubana, Taimara Machin Gomez, que trabalha no povoado, na Unidade Básica de Saúde Goretti Reis, tem dificuldade de chegar ao posto, já que mora no centro de Lagarto e depende do transporte da Secretaria de Saúde, atrasando assim os atendimentos. Com 7 de profissão e uma passagem de 4 anos pela Venezuela, Dra. Taimara considera a cultura do país o principal fator de diferenciação. Ela afirma que não se incomodou em dividir casa com outros médicos, porém, divide quarto com outra médica. “Não pode, a secretária disse que mudaríamos, mas até agora não disse mais nada”, afirmou preocupada com a situação.

Uma enfermeira, que não quis ser identificada por medo de rescisão de contrato, trabalha em um povoado, também num posto improvisado, uma casa de condições precárias. Tem em sua equipe uma médica cubana e afirma que esta também depende do transporte cedido pela secretaria e apresenta problemas de horário de início de atividade. A funcionária se diz favorável ao Programa, frisando que em Lagarto “os médicos não querem trabalhar em povoados. Tem médico que só aparece uma vez por mês”, afirma.

Formado na Universidade Dr. Ernesto Che Guevara, em Pinário Del Rio,Cuba, Dr. Eugênio Rivera, 51, exerce a profissão há 27 anos e decidiu se inscrever no programa por querer ajudar, “Nós cubanos, temos o princípio da internacionalização. Ajudamos países que precisam”. O médico trabalhou anteriormente por 5 anos na Venezuela, em missão especial, proposta pelos dois governos e coordenado pela Organização Mundial da Saúde(OMS). Cuba mantém essa política desde 1978, os estudantes de medicina se comprometem a ajudar países necessitados.

Estrutura dos postos

A dona de casa Eliana Menezes, 51, usuária da Clínica de Saúde Dr. Davi, no bairro Loyola, esperava sua primeira consulta com o cubano, e sua maior preocupação era o idioma. Mas, após a consulta, saiu satisfeita.
Segundo Dr. Eugênio, as críticas sofridas pelos médicos cubanos no início do programa não o atingiram diretamente, “felizmente não tive nenhum confronto”, disse ele em relação aos médicos do posto em que trabalha. Admite que tomou conhecimento das críticas de maneira superficial e lamenta o fato ocorrido.
Dr. Yurex Alberto Dias Morales, 35, e 8 de profissão, que trabalha no bairro Ademar de Carvalho e mora na mesma residência de Eugênio e Taimara, afirma que “lá (Cuba) há uma melhor distribuição de pessoal”. Ele considera o ensino em seu país mais democrático ao dizer que “todos podem ser médicos, eu sou de família humilde e pude estudar medicina”, orgulha-se.

A diretora do Núcleo de Atenção Básica, Maria Madalena Fontes Santos disse, em rápida entrevista, que Lagarto aderiu ao Programa pelo mesmo motivo de todo o Brasil, a necessidade de melhoria do atendimento à população. Na distribuição dos médicos pelos municípios, procurou os postos com melhor estrutura e que não possuíam médicos, contradizendo as condições observadas pela nossa equipe de reportagem.

O Programa

O Programa convoca médicos brasileiros e estrangeiros para atuar nas áreas carentes do Brasil. O Governo Federal adotou a medida devido ao baixo índice de médicos no país (1,8 /1000 hab.), sendo menor nas regiões Norte (0,92) e Nordeste (1,03), o Mais Médicos busca diminuir esse deficit. Também propõe residência obrigatória para os graduados em Medicina, com duração de dois anos. A expectativa é a de criar 12 mil vagas até 2017.
O Estado possui uma média de 1,3 médicos para cada mil habitantes. Chegaram ao Estado um total de 78 médicos, sendo 57 cubanos, 19 brasileiros e dois intercambistas.
Os municípios mais beneficiados foram: Lagarto (10), Nossa Senhora do Socorro (06), Aracaju (05), Capela (05) e Poço Redondo (05).

Críticas

Várias entidades médicas se opõem ao PMM, entre elas, o Conselho Federal de Medicina (CFM) que pede a aplicação do Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos (Revalida) para os estrangeiros. Segundo o Governo Federal, os médicos do Programa só poderão exercer a profissão dentro do programa, por isso não haveria necessidade da realização do exame.

Profissionais da saúde

Através de estudos e do período de dois meses que passou em Cuba, o enfermeiro José Magno Alves dos Santos, 40, contou que os médicos cubanos são treinados com alta tecnologia, mas também são preparados para lidar com diversos tipos de catástrofes, por isso a capacidade de “improvisar” e de se adaptar às dificuldades na estrutura. Também mencionou a solidariedade dos cubanos, que segundo ele, não faz parte somente da área médica, mas está presente em “todo o povo cubano”.
Para ele, a sociedade brasileira coloca o médico num patamar que o faz sentir-se acima dos profissionais de outras áreas e que o PMM tenta mudar essa visão, ao propor que o médico "vá até a população, não o contrário". Esse seria o principal motivo das críticas por parte dos médicos para com o Programa.

Sobre o Revalida, José diz ser “perfeito”, pois, a não realização do exame faz com que o médico se fixe no local, o que seria bom para população. Segundo ele, as críticas sobre o Programa seriam um “engodo da mídia e do CFM para denegrir o Mais Médicos”, disse o baiano natural de Irecê.

Estudantes

Raimundo Dantas Junior, estudante do 3º período de Medicina da Universidade Federal de Sergipe, concorda parcialmente com o Programa. É favorável à vinda dos médicos, porém, acredita que os estrangeiros devem passar pelo Revalida, pois “é necessário ter uma comprovação sobre a eficácia deles”, diz. Raimundo mencionou seu contato com médicos cubanos e, apesar de não encontrar falhas nestes profissionais, acredita que outros podem não oferecer segurança aos pacientes. “Já tive a oportunidade de presenciar o trabalho de alguns médicos cubanos e eles são bons, mas, devem existir outros que não são bem qualificados e isso aí temos que buscar saber”, disse o estudante.

Genilson Ribeiro Santos, 7º período de Medicina da UFS é um dos poucos da classe que apoiam o Programa. Para ele, a ida de médicos para as áreas carentes será importante, porém, faz questão de salientar que a vinda dos estrangeiros deve ser tratada como medida provisória. “Foi um Programa bem pensado, como medida paliativa, como medida definitiva não irá resolver o problema da saúde”.

Sobre a opinião contrária ao Programa por parte de alguns estudantes de Medicina, Genilson aponta a falta de informação como principal causa da discordância, destacando o receio de que estes possuem em relação à concorrência com os médicos estrangeiros no mercado de trabalho: “eles têm medo que os estrangeiros fiquem definitivamente e que o curso de Medicina deixe de ser visto como a ‘chave mágica’ para seu sucesso financeiro”.
                                             

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