6 de jun. de 2011

Lidando bem com as segundas intenções

Por Vanessa Monteiro

Estudante de jornalismo da Universidade Federal de Sergipe, Wesley Pereira de Castro, 30 anos, aracajuano que desde os três anos mora em São Cristóvão, mais precisamente no bairro Eduardo Gomes. Ele sente orgulho da trajetória de vida que construiu para a formação do caráter e intelecto que possui. Em entrevista concedida ao Contexto Repórter A, apresenta fatos marcantes vivenciados por ele, nos mostrando através dessa sucinta biografia, que “a passagem do tempo”, nem sempre é vista como algo negativo, visto que, no transcorrer dos dias, aprendemos importantes lições de vida, amadurecemos, percebemos que nossas intenções iniciais em relação a um dado objetivo, talvez não sejam as mais importantes.
É imprescindível atentar que, à medida que um bebê se transforma em criança, adolescente e adulto, ocorrem mudanças marcantes no que é desejado e em como estes desejos são satisfeitos. As modificações nas formas de gratificação são os elementos básicos das fases do desenvolvimento do ser humano.
O pai da psicanálise Sigmund Freud, falava que aproximadamente entre três a seis anos, a criança entra na “fase fálica”, onde focaliza as áreas genitais do corpo, esse também é o período em que uma criança se dá conta do próprio pênis ou da falta de um. É a primeira fase em que as crianças tornam-se conscientes das diferenças sexuais.

Memórias da infância
“O que lembro da minha infância é a partir dos três anos quando vim morar em São Cristóvão, no bairro Eduardo Gomes. Nessa época entre os três a quatro anos já existia em mim uma vontade imensa de estudar, pois a minha irmã mais velha e minha mãe me ensinaram a ler e escrever em casa mesmo e eu queria ir para escola, mas nessa época para entrar na escola pública as crianças tinham que ter sete anos. Por diversas vezes fui nas escolas com minha irmã mais velha e as diretoras não permitiam minha matrícula.
Meu sonho de infância era ter os livros de português, matemática, estudos sociais e ciências. Recordo que minhas primeiras experiências sexuais com as meninas de 14 anos da minha rua, foram justamente por isso, elas pediam para eu fazer coisas estranhas, a exemplo de pedir para eu colocar uma “coisinha pequena” dentro de um “buraco grande”, para em troca eu ganhar algum desses livros. Uma vez a minha mãe descobriu e naquele momento aconteceu a minha primeira grande “frustração sexual prostituída da infância”, pois fui obrigado a devolver o livro que eu traguei com todo meu esforço erótico e isso me entristeceu.
Quando completei sete anos, consegui ser matriculado, e na primeira semana de aula a Profª Verileine percebeu que eu já estava avançado, aplicou uma prova e uma semana depois eu já estava na segunda série. Eu tinha um distúrbio vocal, minha voz era muito fina e por conta disso os meninos me chamavam pelo apelido de “Chalala”, daí inventei que tinha engolido um grilo que ficou preso na minha garganta para justificar que foi ele que me fez ficar com a voz fina.
A minha mãe durante esse período trabalhava em um emprego que a fazia dormir dois dias no trabalho e um dia em casa, por influência disso e me tornei um menino revoltado, as pessoas mangavam muito de mim. Daí eu jogava pedra em todo mundo, escarrava na prova de religião, chutava a barriga das professoras grávidas, comia picolé do chão por não ter dinheiro para comprar, eu pedia picolé para as meninas e como elas não me davam eu tomava a força. Ou seja, fiz tantas barbaridades que apesar de tirar notas altíssimas na escola, aos dez anos de idade eu fui reprovado e expulso do meu primeiro colégio.”

Trauma de Sexo
“Desde pequeno eu já tinha um grande interesse por filmes e durante toda minha infância não havia televisão na minha casa, pois só foi comprada quando eu tinha 11 anos. Então, quando eu queria assistir o seriado “Tarzan” que passava no SBT, ia para a casa de um vizinho, só que aí ele começava a colocar o pênis para fora e pedia que eu o masturbasse.
Eu como criança de cinco anos, achava que era normal, queria ver o Tarzan e o seriado demorava a começar; eu estava na “fase fálica freudiana” e terminei por relevar. Só que teve um dia que ele tentou forçar uma penetração anal e eu fiquei com muito medo, chorei muito. Lembro que a irmã dele, Débora, apareceu e ele começou a explicar que tinha uma cobra no chão e que esse era o motivo pelo qual eu estava chorando tanto. Isso gerou em mim um tabu na prática do sexo penetrativo.
Para reforçar meu trauma o homem que tentou me estuprar foi assassinado três meses após ter feito isso comigo, e como a minha mãe era amiga da família dele eu tive que ir ao enterro, mas eu não podia contar a ninguém o que aconteceu e só agora eu estou contando esse acontecimento, pois o maior medo que eu tenho até hoje é falar isso para minha mãe e ela se sentir culpada e achar que foi uma mãe ausente, devido ao fato dela trabalhar fora de casa. Só para constar, é através do Contexto Repórter A que venho trazer esse fato a público.”

Sexualidade como pecado na pré-adolescência
“Em minha pré-adolescência após os 11 anos, a sexualidade foi transformada em pecado, pois fui obrigado a freqüentar a igreja católica todos os domingos, depois comecei a decorar os dez mandamentos e descobri que existia um oitavo mandamento chamado “Não Pecar Contra a Castidade”. Como eu não sabia o que era castidade, fui conversar com o padre para saber o que era a castidade e ele não entendeu quando falei que já havia pecado contra a castidade desde os cinco anos.
A partir daquele momento, admiti que aquilo era um pecado violento e me tornei um fanático religioso, sendo que para evitar qualquer contato de abuso, eu só saia de casa para ir a escola. Nessa época, em 1992, foi quando chegou a primeira televisão em minha casa e com ela a nova descoberta que eu tinha uma apreciação cultural diferente dos outros jovens e como eu não saia, exceto para ir a escola, passava a madrugada assistindo filmes existencialistas, tristes e infelizes.”

Aprimoramentos intelectuais
“Não gostei da minha infância, mas da adolescência gosto bastante, mesmo forçado a ser virgem até os 19 anos e ver isso como uma coisa positiva, também tendo que olhar a sexualidade como um pecado, a minha aceitação dessa fase é bastante positiva. Naquela época, apesar de ter uma aversão justificada em andar com pessoas, percebi que, por mais peralta e bandalheiro que eu fosse, elas realçavam que eu era inteligente, esforçado. Por esses e outros fatores fui acreditando que era inteligente, e devido ao meu isolamento comecei a nutrir um grande interesse por curiosidades intelectuais, sabia línguas que nem sempre eram interessantes ao foco estudantil, a exemplo de decorar ficha técnica de filmes, ou seja, minha pré-adolescência e a adolescência efetiva, foram baseadas no aprimoramento dos meus dotes intelectuais que até hoje me define como pessoa.”

A liberdade de expressão através da República Gomorra
“Aos 19 anos quando ingressei na faculdade fui confrontado com pessoas esquisitas, até mais estranhas que eu e daí comecei a ficar mais solto nos relacionamentos interpessoais.
Em relação aos preconceitos, sofri muito com isso quando era criança e por motivo errado, devido a minha voz fina e digo com plena certeza que eu não sou gay e isso não me define. Eu não assumo nenhuma bandeira específica, sou extremamente aberto, pansexual. Apenas gosto de pessoas e a minha graça está em não saber o que sou e ser assim mesmo.
É interessante falar da república gomorra, pois eu vim de um ambiente de repressão religiosa voluntária e comecei a andar com pessoas que são libertinas em proposta e eles se definiam como pessoas que fazem tudo que querem. Na Gomorra aconteciam as coisas mais bizarra que se pode imaginar, quase igual à cidade bíblica do pecado Gomorra. E lá fui aceito como uma espécie de patrono, eu podia fazer tudo e na hora que eu quisesse.”

Família e sexualidade
“Não conheço o meu pai e a única informação que minha mãe me forneceu é que meu irmão mais novo de 28 anos e eu temos o mesmo pai. Inclusive o relacionamento entre nós dois é bem pacífico, e como não tenho relacionamentos. Para ele isso é irrelevante, mas acho que ele desconfia. Além desse irmão tenho mais uma irmã de 47 anos, mas nosso relacionamento é ruim e outro irmão de 44 anos, nós já tivemos brigas violentas, mas hoje ambos adultos não tocamos mais no assunto.
No tocante a minha mãe, como passou muito tempo trabalhando fora de casa, nosso relacionamento era um pouco distante, mas agora que eu estou trabalhando efetivado na Universidade Federal de Sergipe, ela saiu do emprego e agora está aposentada. Então hoje nós estamos muito próximos, ela é uma grande amiga, temos um relacionamento entre mãe e filho criança e nos abraçamos o tempo todo.”

Paixões
“Cronologicamente a grande paixão da minha vida é minha mãe, a amo incondicionalmente enquanto pessoa, em segundo minha outra paixão é o cinema e acho ser impossível falar sobre Wesley, sem ter cinema no meio, depois tem a grande quantidade de livros que leio e isso vem em decorrência do cinema que é a sétima arte e carrega dentro dela as seis artes anteriores que são: música, dança, pintura, escultura, teatro, literatura. Em decorrência disso vem minha paixão pelas artes.
A religião foi outro grande destaque em minha vida, mas como essa passagem pela religião não foi muito pacífica. Hoje eu a trato como a paixão pela liberdade, e se Deus não existir de uma hora para outra, não me arrependerei, pois o que faço hoje, é tudo que faria se Ele não existisse. E como todo mandamento básico, gosto das pessoas como elas são.
Em relação ao DAA – Departamento de Assuntos Acadêmicos, meu ambiente de trabalho é excelente, ali é um ótimo lugar para a experimentação da comunicação social. O relacionamento interpessoal é muito bom, gosto bastante de todos e são pessoas absolutamente abertas. Eu só não posso mais pintar as unhas.”

Experiência de vida x sonhos
“Na universidade achei interessante eu ter sobrevivido a esse universo de pessoas e ainda consegui adquirir méritos de honra independente do contexto social que eu vivo e isso foi muito singular.
Gosto de tudo que tenho e consegui, apesar de todas as graduações que possuo, (Radialismo, Engenharia de Alimentos e Filosofia), acredito que hoje no curso de Jornalismo estou encontrando meu pontencial.
Quando digo que deixei de ter sonhos, quero dizer que prefiro ater-me ao presente, não me deixar levar por ilusões cada vez mais impraticáveis, ao menos num cotejo contextual com as oportunidades de amadurecimento "societal" que não me foram oferecidas ao longo de minha vivência. Fator esse que, obviamente, não implica em dizer que eu seja um desiludido por completo, só acredito que, mais importante do que conquistar novas "riquezas", preciso conservar e/ou manter aquelas que já adquiri até hoje. Venhamos e convenhamos, isto é mais difícil. Ou não é?”


Nota: As imagens postadas na matéria, foram extraídas do acervo cultural de Wesley de Castro.

3 comentários:

Pseudokane3 disse...

Então, é engraçado (e bacana) ler sobre mim mesmo como se eu fosse outra pessoa, como se eu não me conhecesse (kkkkkkkkkkkkkkkkkk)

Numa primeira leitura, portanto, alguns problemas me incomodaram: uma espécie de incoesão estrutural entre as estrofes prosaicas do texto e algumas "deturpações" brancas do que eu depus: 1º - meu relacionamento com minha irmã não é "ruim". Tivemos um atrito e nos vemos pouco, visto que ela mora em Alagoas, mas gosto muito dela, muitíssimo mesmo; 2º - não é que eu não assuma alguma bandeira específica (pelo contrário, sou viciado em "bandeiras" - e tenho certeza de que fui EU quem se expressou mal nesse trecho), só não sou relacionado à tal da "bandeira 'gay'": este termo me causa uma ojeriza terminológica, Vanessa, por isso eu tinha te pedido que verificasse o tópico de 'blog' em que eu escrevo sobre "aversão ao termo 'gay'", mas, deixa quieto: é um mal menor!; e 3º - eu não "possuo" todas estas graduações que enumeraste. Só terminei o curso de Radialismo, os outros todos estão incompletos (kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk) - Ah, se eu tivesse esta capacidade multiformativa (hehehehehe)

De resto, acho que alguns fatos e declarações se acavalam e misturam com outras, tornando-se "estranhas" (que nem a explicação sobre a virgindade, meio deturpada), mas, no geral...

Ai, ai...

Wesley PC>

Isabelle disse...

Puxa, o incrível Wesley em palavras...Bom para conhecer mais dessa pessoa tão "diferente", excêntrica e ao mesmo tempo tão simples, tão gente "do bem". Muito bom descobrir um pouco desse "nosso" personagem da UFS.

flavio disse...

Olá Vanessa,

Primeiramente, não ative este anuncio, pois não faço referencia ao texto.
Você possui o contato do Wesley? Celular, email, ..., qualquer meio.
Caso positivo me passe, gostaria de contatá-lo.
Fico no aguardo.
mrflavioferreira@gmail.com