27 de jan. de 2014

Repercussão do Mais Médicos

O programa concluiu o ano de 2013 com 6.658 médicos e a meta do governo é chegar a 13 mil até março deste ano

Por: Ellen Cristina e Luís Matheus Brito

Seis meses após o lançamento da medida provisória promovida pelo Governo Federal intitulada Programa Mais Médicos no dia 8 deste mês, o governo anunciou o quarto edital do Programa em 17 de janeiro, para os profissionais graduadas em instituições brasileiras ou estrangeiras.

Segundo a Agência Sergipe de Notícias, Sergipe possui 79 profissionais do programa, distribuídos em 31 municípios, sendo 11 brasileiros, dos quais dois se formaram no exterior, e todos os estrangeiros são cubanos.

De acordo com uma das médicas supervisoras de referência técnica da área de ensino CEPES (Centro de Educação Permanente em Saúde) Maria Aquino Gonçalves, os médicos brasileiros não aceitam trabalhar em locais interioranos, pois as condições são subumanas, onde falta infraestrutura, como remédios, curativos, macas e o que possuem para o atendimento básico não estão mais em condições de serem usados. Acerca da não realização do exame Revalida, ela diz: "Houve o burlamento da lei com a permissão do atendimento por médicos estrangeiros quando não fizeram o exame nacional obrigatório". Ela ainda falou que médicos que anteriormente trabalhavam no interior foram demitidos pela Prefeitura de Aracaju, pois com a contratação de outros pelo programa, quem pagará o piso salarial será o governo federal.

O estudante de Medicina da UFS (Universidade Federal de Sergipe) do quarto período Arthur Felipe Barbosa Vasconcelos, 19 anos, possui opinião dúbia sobre o assunto: "A medida é uma demagogia eleitoreira, o governo fala e a população desassistida cai. O problema é estrutura. Aumentam o número de vagas, mas não melhoram a estrutura, ficará uma bagunça maior. É um pouco triste, principalmente, para pessoas, como eu, que querem trabalhar no interior”. Perguntado sobre sua opinião acerca do não cumprimento do exame Revalida, ele diz que: "Os médicos exigem uma prova de revalidação, mas nem eles mesmos fazem um exame de ordem, como a OAB faz com o que querem advogar". Ele falou também que muitos estudantes levam o curso com a barriga e não possuem uma opinião formada ou deixam-se influenciar pela opinião da maioria sobre o assunto.

Prefeitura de Aracaju não vem pagando a ajuda de custo aos médicos

A aracajuana Daniela Alves Freire, 27 anos, formada na Universidade Federal de Alagoas (UFAL), diz que um dos pontos negativos do programa é o não pagamento da ajuda de custo exigida da prefeitura no edital do programa. Ela diz já ter recorrido à Secretaria Municipal de Saúde, porém a secretaria ainda não se pronunciou: “Só querem que a gente trabalhe”, desabafa Daniela.

Graduada em julho de 2013, a médica aderiu ao programa, pois pode unir o trabalho aos estudos, além de poder trabalhar em sua cidade, Aracaju. Ela faz pós-graduação em medicina da família e retornou em dezembro à comunidade do bairro Santos Dumont, zona norte de Aracaju, na Unidade de Saúde da Família (USF) João de Oliveira Sobral.

Suas atividades na USF João de Oliveira Sobral se estenderam entre setembro a outubro de 2013, quando, mudou-se para a USF Eunice Barbosa de Oliveira no bairro Coqueiral, zona norte da capital, onde ficou até o início de dezembro. Daniela Freire conta que houve "um bullying" em sua atuação no bairro Coqueiral. Segundo ela, uma das médicas da unidade não admitia que ambas atendessem o mesmo número de pacientes, visto que Freire ganhava mais. Essa foi uma das causas que fez a profissional retornar à unidade do bairro Santos Dumont.

Unidade de Saúde da Família João Oliveira Sobral
Foto: Luís Matheus Brito
A professora Elizabethe Neves, 36 anos, diz que ainda não foi atendida pela médica, mas que soube das constantes faltas dela. Quando questionada sobre o assunto, Freire afirma que por falta de comunicação eficiente entre o posto e a comunidade, os cidadãos não possuem clareza de que ela realiza especializações através do programa durante as sextas-feiras.

Segundo o aposentado José Amintas de Souza, 56 anos, a chegada da profissional trouxe melhorias para o atendimento no posto, apesar da lotação constante: “Dia de segunda que é pior”, concluiu Souza.

Médicos cubanos em Lagarto

O município de Lagarto localizado na região agreste do Estado, a 75 km da capital sergipana, foi contemplado com dez médicos, todos cubanos, e sendo a prefeitura responsável pela logística e distribuição deles nas comunidades. A Clínica de Saúde da família Dr. Davi Marcos de Lima no conjunto Albano Franco em Lagarto, recebeu em outubro de 2013 o médico cubano Yoel Ângelo Arano Matamoro, 38 anos, e em novembro o médico Eugenio Rivera Cordeiro, 51 anos. Ambos encaminhados pelo governo cubano para participação no programa.

Cordeiro e Matamoro foram entrevistados no último dia 14, por volta das 15h30, após terem concluído seus atendimentos. Segundo Matamoro, ele atendeu 14 gestantes ao longo do dia: “Temos um cronograma de atendimento para toda a população: gestantes, idosos, crianças, visitas familiares”.

Eles já realizaram trabalhos humanitários na Venezuela. Cordeiro atuou entre 2006 a 2011 e Matamoro de 2007 a 2011, também sendo encaminhados pelo governo de Cuba. Para Matamoro, a primeira diferença que encontra entre o Brasil e Venezuela é a receptividade do povo. Os médicos foram questionados quanto à sua chegada ao país: “Em Brasília houve barulho” disse Cordeiro, já quando chegou à Aracaju, afirma que foi tranquilo, pois coincidiu com o falecimento do governador Marcelo Déda.

Os médicos cubanos passaram um período de 21 dias para a realização de avaliações e treinamento na cidade de Brasília em instituições do programa. Eles dizem ter vindo ao país sem possuir nenhum conhecimento em língua portuguesa e afirmam ter problemas para falar.

Clínica de Saúde da Família Dr. Davi Marcos de Lima, em Lagarto
Foto: Ellen Cristina
A infraestrutura dos postos de saúde foi uma das reivindicações apresentadas pela comunidade médica brasileira para não execução do programa. Os médicos cubanos dizem não ter passado por nenhuma dificuldade até agora, por tal questão, “Nossa medicina nós temos aqui [apontou para a cabeça]”, disse Matamoro, “Nós trabalhamos com nosso conhecimento, com nossa cabeça”, concluiu. Quando indagados sobre receberem do governo, tablets e livros, falaram que já possuíam, mas eles dizem ser antiético estar com eles quando estão atendendo.

A gerente da Clínica Dr. Davi Marcos de Lima, Josefa Maria Costa Silva, 48 anos, diz não passar por problemas com os médicos e que a comunidade “está adorando” a permanência deles. A técnica de enfermagem Maria Carolina, 33 anos, confirma o relato da gerente e conclui: “Eles estudam mesmo”. Quanto à infraestrutura do posto informaram que não há falta de nada, por enquanto. Cordeiro e Matamoro pretendem continuar a atuar no programa Mais Médicos após a estadia de três anos, caso o país necessite: “Nós trabalhamos onde seja preciso”, disse Cordeiro.

A respeito das famílias poderem os acompanhar, o assunto só fora tocado uma única vez pelos dirigentes do programa, porém quando já estavam em Brasília. A comunicação com Cuba também foi lamentada: "Lá não possui notebook, o único jeito de conversar é por telefone, e é muito caro, não tem nenhum plano, sai do nosso bolso", disse Matamoro. Quanto ao piso salarial, eles falaram que o salário é distribuído entre a família, o governo cubano e os médicos.

Da esq. à dir.: os médicos cubanos Yoel Matamoro e Eugenio Cordeiro; e a repórter  Ellen Cristina
Foto: Luís Matheus Brito


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