A história do Brasil mostra como a mistura de cores, costumes, crenças e raças ajudaram a criar a “cara” do nosso país. Mas apesar de todas essas características, é aqui que alguns grupos encaram sérios embates de intolerância e preconceitos culturais, étnicos e religiosos.
De acordo com dados do levantamento feito pelo Censo de 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o país é o mais católico do mundo, cujos seguidores junto com os protestantes, compõem mais de 80% da população formada por cristãos. Entre as crenças consideradas minoritárias no país estão o espiritismo, cujos adeptos correspondem a 2% da população, segundo o IBGE, e o budismo, com apenas 0,10% de participantes.
Segundo o artigo 19, inciso I da Constituição de 1988, a liberdade de crença e o livre exercício dos cultos religiosos são direitos de todo cidadão, aos quais deve ser garantido liberdade e dispensado qualquer tipo de opressão vinda do Estado.
Roseli Fischmann, mestre em Educação e doutora em Filosofia e História da Educação pela USP, considera que há condições importantes para a pluralidade de culturas e religiões. No livro “Estado Laico, Educação, Tolerância e Cidadania: para uma análise da Concordata Brasil”, ela afirma:“Se pela lei se diz a alguém que pode crer (ou não crer) no que e como quiser como deve ser no Estado laico, para depois, de forma contraditória, oferecer privilégios aos adeptos de determinado grupo, instala-se discriminação entre cidadãos de igual valor".
Histórias de discriminação
Ainda no período da escravidão, as primeiras manifestações de crenças afro descendentes começaram a ser tratadas com muita opressão e preconceito. Em âmbito religioso, seus seguidores resistiram e até os dias de hoje possuem uma forte influência cultural na sociedade brasileira. Porém, o preconceito também acompanhou outros grupos, como o Candomblé e a Umbanda, as principais religiões africanas praticadas no Brasil.
Nas décadas de 1930 e 40, o Estado brasileiro chegou a proibir manifestações da Umbanda, o que forçou os seus seguidores a fazer suas cerimônias de forma clandestina.
Carlos Magno, "Pai de Santo" elenca histórias das quais passou em sua crença |
Carlos também afirma que com o tempo não houve diferença na tolerância de outras religiões com o Candomblé, principalmente o preconceito vindo de cristãos. “Quando eu iniciei na vida do Candomblé, a casa era cheia e ainda hoje é, mas muitos olhavam feio e muitos ainda olham”, reitera o “Pai de Santo”.
Mas nada abala sua crença. De forma muito confiante, Carlos Magno afirma que apesar da intolerância de alguns, é comum membros de outras religiões visitarem o seu terreiro à procura de conselho, ou até mesmo para participar das sessões em busca de coisas boas em suas vidas, ainda que sempre demonstrando “um pé atrás”.
“Tem um padre ortodoxo de interiorzinho (sic) de Riachuelo (SE) que as vezes vem, traz coisas e participa de celebrações no terreiro também. Os pastores ou gente de outras religiões que vem em busca de atrair coisas boas para vida deles chegam e olham tudo meio desconfiados, mas a gente já [se] acostumou. Nós estamos aqui é ‘ajudar’ quem precisa”, comenta o Pai de Santo.
A missionária Ana Maria Silva contou sobre os preconceitos que viveu |
“Quando você muda de religião e passa a segui-la é um grande impacto para algumas pessoas. Geralmente elas cortam ligações por causa disso. Soube de casos até onde líderes de outras igrejas ordenaram que seus seguidores não visitassem mais minha casa, o que causou um clima constrangedor para mim e para a outra pessoa”, destacou Ana.
Ana Maria acredita que existem caminhos para diminuir conflitos e a intolerância religiosa, e apesar de ver esses casos de intrigas entre religiões serem tão constantes, não mede esforços para ajudar a melhorar a convivência nas relações religiosas. “Eu participo de encontro com representantes do Catolicismo, Umbanda e Espiritismo visando uma relação mais amigável entre as doutrinas, porque eu acredito que há sim a possibilidade para a convivência de várias religiões”, relatou a missionária.
Papel do Estado
O padre Giovane Bonfim defende que há intolerância em um estado laico, porém defende que a paróquia precisa de ajuda do estado |
Ainda segundo o sacerdote, a intolerância com os católicos vem crescendo, mas já houve tempos mais sombrios. Ele recorda um caso ocorrido em um feriado de 1995, 12 de Outubro, dia dedicado à padroeira do Brasil, quando um pastor da igreja Universal provocava e xingava uma imagem da santa enquanto a chutava. “Lembro quando vi na TV um pastor evangélico chutar a imagem de Nossa Senhora de Aparecida, uma cena lamentável”.
A complexidade do assunto permanece com vários pontos de vista, muitas queixas de todos os lados e infelizmente poucas soluções. Cada religião defende seu ponto ideológico; alguns tentam convencer e levar os outros para o lado de “sua verdade” por meio do ‘proselitismo’, ação de tentar converter o outro em prol de doutrina, ideologia ou religião.
São vários lados, vários pensamentos e uma utopia da liberdade religiosa à espera de um milagre: o dia em que todos desfrutem, ainda que num futuro indeterminado, da liberdade de ser e acreditar no que quiser.
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